Fazer educação, fazer o Brasil

Wojciech Andrzej Kulesza

Inicialmente fiquei surpreso, depois assustado, com a grande quantidade de intenções de voto para a Presidência da República, reveladas pelas pesquisas de opinião, dirigidas a um desconhecido deputado de um insignificante partido político. Graças a um confuso atentado perpetrado contra sua vida, de repente o desconhecido se tornou famoso, sem nada precisar dizer. Todavia, as mesmas enquetes que exibiam seu crescimento na corrida eleitoral também apontavam que essas intenções de voto provinham em grande parte de entrevistados escolarizados: quanto maior a escolarização do eleitor, maior sua intenção de votar nesse deputado. Seus aliados chegaram a sugerir até a extinção do direito de voto dos analfabetos, consagrado pela Constituição de 1988, “por não saberem votar”. Sei que a formação escolar ministrada no Brasil não é lá grande coisa, mas seria assim tão má a nossa escola? Seria uma “escola com partido”?

Fato é que as previsões das pesquisas se confirmaram e o deputado foi para o segundo turno das eleições, já tomando boa dianteira de seu concorrente. A hipótese da má educação de nossas escolas foi se fortalecendo à medida que novas pesquisas confirmavam o alto percentual de intenções de voto a seu favor. Entretanto, empolgados com o sucesso da campanha, seus correligionários começaram a falar: muitas críticas à situação brasileira atual, poucas propostas de solução e intensa demonização de seu adversário. Foi então que o candidato, restabelecido e visivelmente envaidecido com sua performance eleitoral, escancarou a boca para dizer a que veio. Um horror inimaginável. Fugindo dos debates, propagava autocraticamente seu discurso pelas redes sociais que então passaram a reviver episódios marcantes da vida do deputado, configurando-se claramente sua posição de extrema direita, fascista.

Todavia, seus violentos ataques aos direitos humanos, às liberdades democráticas tão duramente conquistadas e às políticas sociais destinadas à melhoria das condições de vida e de trabalho, foram ferindo a dignidade dos brasileiros, despertando repulsas na sociedade. O espanto inicial virou inconformismo e logo veemente repúdio às suas posições antidemocráticas que punham em riscodiretamente mulheres, ativistas LGBT, defensores dos direitos humanos, ambientalistas e povos indígenas. Retrocedendo aos tempos da ditadura, o candidato ameaçou seus adversários políticos com a repressão e a tortura do regime militar. Desclassificando os movimentos sociais, considerados por ele inaceitável “ativismo”, sua candidatura deixou clara a intenção de fazer retroagir a roda da história, revertendo conquistas sociais e trabalhistas.

Pouco a pouco, à medida que se iam replicando as pesquisas, destacou-se o evidente crescimento da rejeição ao candidato pelo eleitorado, fazendo com que se estancasse seu crescimento e se revertesse a intenção de voto de muitos eleitores. Pensei então que afinal a educação não é tão má assim, na verdade o que a campanha do candidato trouxe a lume foi a existência de mal-educados. Mal-educados, isso sim é que eram seus correligionários, seus apoiadores, mais para bárbaros que para civilizados, tentando iludir o eleitor. Sua aprovação inicial não foi devido à má educação do povo brasileiro, mas sim à deseducação, a falta de educação pública, gratuita e de qualidade para todos no Brasil. O exercício da violência própria da barbárie, significativamente associada à condição de ex-militar do candidato, violência simbólica principalmente, mas física se necessária, condicionou a ação dos eleitores, constrangidos a responder aos interrogatórios dos institutos de pesquisa.

A disputa do segundo turno que parecia ser entre dois candidatos teve que abrigar todo um leque de eleitores, cujos candidatos foram preteridos no primeiro turno, que faziam questão de dizer sim, não a algum candidato, mas à democracia. O grito de “elenão” ecoou nas cidades reunindo multidões dos mais diversos credos, das mais diferentes cores, de todos os gêneros, a repudiar a candidatura reacionária. E as redes sociais se inundaram de mensagens contra o candidato, manifestos em defesa da democracia se multiplicaram, desvelando de uma vez o autoritarismo do candidato. A tendência apontada pelas pesquisas virou e, sem saber que seguiam Paulo Freire, os eleitores se baseavam em sua leitura do que estava acontecendo para declarar seu voto. O certame eleitoral era agora entre a civilização e a barbárie, entre a democracia e a ditadura, pela paz e contra a violência.

Porém, a grande mobilização contra o candidato não impediu a sua eleição, deixando momentaneamente suspensos no ar os desejos de um país justo, democrático, plural, de milhões de brasileiros. Passadas as eleições esses desejos serão retomados e a política voltará com força em nosso cotidiano, não para que votemos, mas para que nos comportemos de acordo com eles. Não será fácil. Aos educadores, aos que fazem a educação, caberá o desafio de continuar a luta e manter vivos esses desejos de um futuro melhor para o povo brasileiro, crianças, jovens e adultos. O chão da escola será o palco onde doravante será pensado, trabalhado, meditado, o esperançar que brotou nestas eleições. Esperançar, conforme Paulo Freire, “é se levantar, esperançar é ir atrás, esperançar é construir, esperançar é não desistir. Esperançar é levar adiante, esperançar é juntar-se com outros para fazer de outro modo”.


Imagem de destaque: Lucas Negrisoli

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