“Eu não posso ser, se os outros não são”:

uma leitura da série Paulo Freire, um homem do mundo

Alexandra Lima da Silva

“O meu sonho fundamental é o sonho pela liberdade que me estimula a brigar pela justiça, pelo respeito do outro, pelo respeito à diferença, pelo respeito ao direito que o outro tem, que a outra tem, de ser ele ou ela mesma. Quer dizer: o meu sonho é que nós inventemos uma sociedade menos feia do que a nossa de hoje, menos injusta, que tenha mais vergonha. Esse é o meu sonho. O meu sonho é um sonho da bondade e da beleza”

(Paulo Freire).

Em tempos de isolamento social como estratégia de sobrevivência, ver a série Paulo Freire, um homem do mundo é como encontrar água após um longo caminhar na aridez de um mundo que se faz deserto. É preciso que as gerações futuras tenham a oportunidade de conhecer o significado da “educação como prática de liberdade” e aprender que não existe justiça num mundo que se estrutura na desigualdade.

Estruturada em cinco episódios, a série documental é uma produção que precisa ser exibida e discutida nos cursos de formação de licenciatura do Brasil. É preciso que as pessoas que escolheram a docência como profissão, leiam o pensamento de um homem que mesmo tendo sido preso, exilado e perseguido em vida e após a morte, segue presente. Segue nos ensinando. Segue nos inspirando. Segue urgente e atual. Paulo Freire escreveu muitas cartas que ainda estão à procura de destinatários e eu realmente acredito que alguns destes destinatários ainda precisam nascer. Se a educação muda as pessoas e se as pessoas transformam o mundo, precisamos escolher que mundo queremos construir em nossas escolhas e ações coerentes no presente. Precisamos ter consciência do que estamos deixando de legado para os que ainda não nasceram: será um mundo em que respirar se tornou um privilégio e que as desigualdades devem ser naturalizadas e banalizadas?

A urgência de praticarmos a Pedagogia do Oprimido neste momento é exatamente porque vivemos num tempo em que mais do que nunca, “precisamos defender o óbvio”, pois é desolador ver muitos oprimidos se identificarem e defenderem os interesses do opressor. Eu gostaria de compreender por que muitas pessoas preferem abraçar a morte.

É preciso aprender que não devemos abraçar aqueles que defendem a nossa morte. Não devemos negociar a nossa humanidade e o direito de todas as pessoas de seguirem vivendo. Se não somos capazes de aprender que “eu não posso ser, se os outros não são”, nosso legado para a humanidade será um futuro de cinzas e destruição. Certa vez, Paulo Freire perguntou: “qual é o sujeito beneficiário do teu sonho?”. O meu sujeito é aquele que ainda não nasceu. Precisamos garantir que ele possa nascer e crescer num mundo em que todos possam respirar.

 

Referências:

Paulo Freire, um homem do mundo. Série Documental. Direção: Cristiano Burlan, 2020.

KOHAN, Walter. Paulo Freire, mais do que nunca. 1. ed. São Paulo: Vestígio, 2019.

FREIRE, Paulo. Pedagogia do oprimido. São Paulo: Paz e Terra, 1974.


Imagem de destaque: Sesc TV/divulgação

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *