Eleições para Reitor: autonomia em risco

Wojciech Andrzej Kulesza

Toda instituição social tem um dirigente, chamado de líder, chefe, superintendente, comandante, presidente, etc. Além de dirigir as ações da instituição e a atuação de seus membros, ele a representa em outras instâncias e responde por ela perante a sociedade. A modernidade revisou as formas jurídicas tradicionais pelas quais os dirigentes eram “naturalmente” reconhecidos, tais como o direito divino dos reis ou a aristocracia de sangue. Hoje ninguém nasce dirigente. Na instituição familiar, por exemplo, há muito tempo deixou-se de considerar o pater famílias como seu dirigente legítimo com autoridade reconhecida. De forma cada vez mais frequente e disseminada no tecido social considera-se que as pessoas que constituem as instituições devem influir decisivamente no processo de formação e reconhecimento de seus dirigentes.

Espelhado no modelo político de representação, a escolha dos dirigentes nas instituições recorre frequentemente a programas, candidatos, campanhas, votos, eleições enfim, trazendo para o processo toda a problemática que envolve a complexa tarefa de constituir uma representação democrática. Supostamente, as instituições que se utilizam desse mecanismo de decisão têm autonomia para fazer isso, o que não significa que elas possam fazer o que quiser. Afinal elas fazem parte de uma determinada sociedade, local, nacional ou planetária, que tem todo o direito de saber o que elas estão pensando ou fazendo. Devido a essa interdependência entre as instituições sociais, o movimento de democratização da escolha de dirigentes por meio da participação efetiva dos membros que compõem a instituição confronta-se com a questão de como a sociedade em geral avalia suas escolhas.

Uma prática corrente de tratar essa questão consiste na apresentação para a sociedade não de um único nome para chefiar a instituição, mas de uma lista de pessoas todas elas consideradas elegíveis para o cargo. Como essa lista, sêxtupla ou tríplice, é acompanhada de um relatório sobre todo o processo de escolha, inclusive a forma como foram definidos o colégio eleitoral e o modo de se computar os votos, os órgãos encarregados da decisão final podem avaliar quantitativamente as preferências dos

membros daquela instituição. As diferenças entre os percentuais obtidos pelos candidatos, a dispersão geográfica ou funcional dos votos, enfim a distribuição dos votos pelos candidatos, permite que se julgue em que medida o indicado em primeiro lugar reflete majoritariamente as prioridades da instituição.

Quanto maior for o engajamento dos membros da instituição nessa consulta, mais democrática será e mais bem definidas as metas e objetivos pretendidos para a instituição. Nem sempre, porém, as metas e objetivos definidos pela instituição são as mesmas desejadas pelos órgãos responsáveis pela nomeação do dirigente. Nesse caso, o órgão pode demonstrar sua insatisfação deixando de nomear o primeiro classificado ou mesmo devolver a lista para que a instituição faça outra. É o que está acontecendo no atual governo, com uma frequência expressiva, na nomeação de dirigentes de diversos órgãos públicos brasileiros, dentre os quais se destacam as universidades federais, nas quais o processo de consulta à comunidade tem uma longa tradição, confundindo-se com a luta em defesa de sua autonomia.

Sendo obrigada por legislação infraconstitucional a restringir a autonomia conquistada na Constituição e se conformar com normas arbitrárias, tais como aquela que exige que o peso dos votos dos docentes no computo do resultado da consulta para reitor seja no mínimo de 70%, a Universidade ainda corre o risco do presidente da República, ouvindo o Ministério da Educação, não escolher o candidato mais votado no certame. A grande frustração da comunidade ao ver o nome de sua preferência ser vetado pelas autoridades governamentais corrompe a normalidade acadêmica, interrompendo trabalhos em curso e paralisando projetos em desenvolvimento. Quanto maior a representatividade do nome preterido da lista, expressa pelo voto majoritário de professores, funcionários e alunos, maior o risco de um impasse com danos incalculáveis para a Universidade e para a sociedade que a sustenta.

É compreensível que se sancione o segundo, ou terceiro da lista, desde que haja razões objetivas para isso, demonstráveis por seu programa de ação, pela dispersão dos votos ou mesmo por seu perfil acadêmico, nunca por questões ideológicas ou partidárias.

Pode-se ter certeza que nesses casos a comunidade universitária saberá compreender essas razões e aceitar a decisão. Todavia, as posições radicais que têm sido defendidas pelo governo na área de educação, atacando de todas as formas as universidades públicas federais, limitando cada vez mais seu aporte de recursos, materiais e humanos, indicam que essas decisões estão sendo tomadas no sentido de minar completamente esse processo de consulta. O incitamento da balbúrdia nas universidades pelo governo

tem o objetivo claro de desqualificar o processo construído a duras penas nos últimos anos de escolha de seus dirigentes. O alvo visado com essas nomeações estapafúrdias não são propriamente as universidades, mas um constituinte fundamental dessas instituições: sua autonomia.


Imagem de destaque: Geraldo Magela/Agência Senado

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