Eleições para os conselhos tutelares: o que a escola tem a ver com isso?

Luiz Carlos Castello Branco Rena

No próximo dia 06 de outubro os e as brasileiros(as) que quiserem poderão participar das Eleições Unificadas para os Conselhos Tutelares em cada um dos municípios brasileiros conforme §1º do Art139 do Estatuto da Criança e do Adolescente – ECA. Cabe aos Conselheiros Tutelares entre outras atribuições:

 

“… encaminhar ao Ministério Público notícia de fato que constitua infração administrativa ou penal contra os direitos da criança ou adolescente; (…)promover e incentivar, na comunidade e nos grupos profissionais, ações de divulgação e treinamento para o reconhecimento de sintomas de maus-tratos em crianças e adolescentes.” (ECA)

Desde 13 de julho de 1990 podemos afirmar que temos, talvez, a mais avançada legislação do mundo no que se refere à proteção da criança e do adolescente. O ECA resultou da constatação desconfortável e incômoda de que a parte da população menor de 18 anos estava exposta a situações de vulnerabilidade extrema, pessoal e social, em quase todos os espaços de convivência social, inclusive nos âmbitos da família e da escola. A noção de criança e adolescente como sujeito de direitos expressa na Constituição Cidadã de 1988 precisava alcançar as ruas, as casas, as escolas, as empresas, os serviços de saúde, os dispositivos de segurança pública, contaminando as políticas sociais implementadas pelo poder público e as entidades parceiras. Ao construir um marco jurídico para regular as relações com crianças e adolescentes a sociedade brasileira deu uma passo fundamental para cumprir a Declaração Universal dos Direitos Humanos, da qual somos signatários. Ao longo destes 29 anos de sua execução, exigindo da sociedade uma mudança de postura ética e uma prática mais coerente com o que se convencionou chamar de mundo civilizado, vários pontos do ECA tem mobilizado o debate acirrado sobre suas consequências no cotidiano da sociedade brasileira. A ascensão ao poder de um grupo claramente identificado com um projeto neo-fascista de sociedade fortaleceu as vozes que se levantam para atacar o ECA e até mesmo pedir sua revogação. Em declaração bastante vulgar e inadequada a um Chefe de Estado o atual presidente afirmou recentemente “que o destino do ECA é a latrina”, acirrando e desqualificando o debate, que se faz necessário para atualizar a lei considerando os desafios do nosso tempo. As profundas mudanças que ocorrem na sociedade nos impõe a tarefa inevitável de ajustar ou reinventar a norma jurídica para fazer avançar as concepções e consolidar os direitos da cidadania.

No entanto, o ECA permanece em vigor com força de lei, produzindo efeitos diversos em várias dimensões da vida e sustentando práticas sociais de promoção da vida e proteção de crianças e adolescentes em todos os setores e alcançando todas as classes sociais. Passar da letra da lei à vida real no cotidiano dos cidadãos e cidadãs leva tempo e demanda estruturas, mecanismos e dispositivos indispensáveis que a própria legislação prevê. Os Conselhos de Direitos da Criança e do Adolescente – CDCA e os Conselhos Tutelares – CT são dois importantes dispositivos disponíveis para fazer valer a legislação. Favorecendo a participação democrática da população o legislador, em diálogo com as organizações da sociedade civil envolvidas com crianças e adolescentes da época, estabeleceram que os conselheiros tutelares seriam escolhidos pela população através voto direto.

Em cada Município e em cada Região Administrativa do Distrito Federal haverá, no mínimo, 1 (um) Conselho Tutelar como órgão integrante da administração pública local, composto de 5 (cinco) membros, escolhidos pela população local para mandato de 4 (quatro) anos, permitida 1 (uma) recondução, mediante novo processo de escolha. (ECA/Lei nº 12.696, de 2012).

Qualquer cidadão(ã) poderá ser candidato(a) ao exercício dessa função desde que atenda os seguintes critérios: a) comprove reconhecida idoneidade moral; b) tenha idade superior a vinte e um anos; c) residir no município em que está se candidatando. (ECA ART. 133)

A preocupante escalada da violência associada a expansão das redes do tráfico de drogas na sociedade brasileira nas últimas décadas ultrapassou os muros da escola e chegou às salas de aula. Além disso, estudos em diferentes campos de saber apontam para o crescimento da negligência e maus-tratos familiares, bem como do aumento de índices de crianças e adolescentes inseridos prematuramente no mundo do trabalho, às vezes insalubre ou com potencial de risco elevado. Essa realidade produtora de sofrimento físico e psíquico na criança e no adolescente impacta a comunidade escolar em diversos aspectos para além do acadêmico e em muitas situações é na escola que a criança ou adolescentes revelam as sequelas ou emitem os sinais de socorro. Há situações de sofrimento ou risco à saúde e a vida que impõem aos profissionais da educação a obrigação ética da denúncia, às vezes, tendo o Conselho Tutelar como último recurso. Há também, situações que a Escola se vê interpelada pelos Conselheiros Tutelares por que a fonte de sofrimento e dor está localizada na Escola mesma ou por que cabe a escola ampliar as informações sobre determinados casos para qualificar uma decisão que poderá impactar definitivamente a vida de uma criança ou adolescente.

Portanto, a comunidade escolar não pode ficar alheia ao processo de escolha dos Conselheiros Tutelares já em curso nas comunidades onde estão inseridas. Sobretudo naquelas comunidades e municípios onde a relação entre Escola e CTCA é muito conflitiva, às vezes tensa e desgastada. Todas as escolas da Educação Básica das redes pública e privada deveriam incluir em seu planejamento dos próximos meses o tema das eleições unificadas para os CT. Ao mobilizar estudantes, trabalhadores da educação, pais e familiares para reflexão crítica sobre o papel social dos CTCA, discutindo seus limites e suas possibilidades, a Escola cumpre seu papel principal: socializar o saber, transformando informação em conhecimento que inspire práticas transformadoras da realidade. A Escola como lugar de produção de subjetividades poderá contribuir muito para a qualificação da Eleição Unificada de Conselheiros Tutelares convocando a comunidade a assumir o lugar de protagonista na escolha daqueles e daquelas que serão investidos de poder, ocupando por quatro anos um lugar estratégico no cuidado de crianças e adolescentes, sobretudo dos mais frágeis e em situação de vulnerabilidade social.

Neste momento histórico em que a democracia está ameaçada uma das respostas possíveis é fortalecer e aprofundar os processos de participação e os fóruns de discussão das necessidades da população. Os sistemas de conselhos nas diferentes políticas públicas nunca estiveram tão ameaçados de extinção ou de esvaziamento das suas funções. Movimentos de ocupação dos CTCA por grupos políticos e religiosos fundamentalistas vinculados às Comunidades Terapêuticas e outras práticas de cerceamento de direitos já foram detectados em alguns municípios. A Escola tem a tarefa política de potencializar esse processo mobiliando a participação das comunidades, chamando os candidatos a ocupação das vagas nos conselhos para que se submetam ao debate, sobretudo com as crianças e adolescentes, principais interessados no funcionamento transparentes dos Conselhos de Direitos e Conselhos Tutelares.


Para saber mais

Programa Prefeito Amigo da Criança
Portal dos Direitos da Criança e do Adolescente
Imagem de destaque: Guillaume de Germain / Unsplash

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