Educação, nazi-fascismo e intolerância. O que podemos fazer?

Aline Choucair Vaz*

Vivemos tempos de inquietação no que tange a nossa sobrevivência no Planeta. Estes momentos são capitaneados na atualidade pela crise na saúde e também política ocasionada pela COVID-19, com os dilemas colocados por alguns em relação ao paradigma: o que mata mais? A queda da economia ou a doença? Em relação aos Direitos Humanos e, sobretudo, à Declaração Universal dos Direitos Humanos, marco político e humanitário de 1948, com o seu artigo 25: “Todo o homem tem direito a um padrão de vida capaz de assegurar a si e a sua família, saúde e bem-estar, inclusive alimentação, vestuário, habitação, cuidados médicos e os serviços sociais indispensáveis, e direito à segurança em caso de desemprego, doença, invalidez, viuvez, velhice ou outros casos de perda de meios de subsistência em circunstâncias fora de seu controle”.  A Declaração Universal dos Direitos Humanos foi um marco após o término da Segunda Guerra Mundial em 1945 e às atrocidades que aconteceram no mundo em decorrência dela: era necessário salvaguardar os direitos essenciais à vida para viver e não apenas sobreviver com uma incidência alta movida por interesses econômicos, políticos e xenofobia.

Sobre a xenofobia, vamos a nossa conversa de hoje com o papel da educação para tratar desse assunto. O Brasil, assim como o mundo, tem apresentado um aumento do discurso nazista e fascista, muito presentes na Segunda Guerra Mundial, e agora aumentado em virtude de problemas sociais, políticos e econômicos. Denise Chrispim Marin, em 17 de janeiro de 2020, na Revista Veja, destaca que símbolos nazistas e manifestações antissemitas aumentam no mundo, sendo os Estados Unidos e Europa, palcos de atos de violência e de vandalismo. Também aborda pesquisa que aponta existência de 334 células nazistas no Brasil. Nas últimas eleições presidenciais de 2018 e à ida do núcleo político atual no Poder, muito desse discurso foi posto em voga, tendo um capítulo em destaque, quando em janeiro de 2020, o secretário nacional da Cultura faz um vídeo sobre artes, semelhante ao do ministro de propaganda do nazista Hitler, Joseph Goebbels. O secretário especial da Cultura do governo, assim como Goebbels havia afirmado em meados do século XX, que a “arte alemã da próxima década será heroica e imperativa”. O secretário afirmou que a “arte brasileira da próxima década será heroica e imperativa”. Além disso, ele discursou com imagens e outras frases similares aos nazistas. Essa fala teve uma enorme repercussão na mídia e nos meios sociais, sobretudo, com a reprimenda da comunidade judaica, povo mais hostilizado pelos nazistas na Segunda Guerra Mundial, e o presidente brasileiro teve que substituir o secretário em questão. No entanto, se observa que isso não necessariamente, representa uma discordância com essas ideias, mas sim, fruto de uma pressão política e decisiva da comunidade semita naquele momento.

Embora tenha retirado o secretário desta função, muito do ocorrido expressa os rumos que governantes e a extrema-direita em ascensão têm preconizado no Brasil e no mundo: o horror às etnias e culturas diferentes, que expõem no plano social, as camadas populares e o ataque aos direitos coletivos. Esse processo tem como base o debate sobre um conceito fundamental e muito antigo na história mundial: a intolerância. Para Elie Wiesel, no Foro Internacional sobre Intolerância, em 1997, publicação no Brasil em 2000, “A intolerância é mais complicada, porque mais sutil. Onde reconhecê-la? Como discerni-la? São muitas as respostas, sem dúvida, mas conheço apenas uma: de uma ideia ou de um movimento que inspirem o ódio […]. Digamos que a intolerância está situada no início do ódio. Se não a vermos, será tarde demais”. O ódio é preconizador da intolerância e se esse discurso se banaliza na sociedade e está capitaneado por autoridades políticas, fica cada vez mais tenso e difícil combater um sentimento de aniquilar ou destruir o outro que pensa ou é diferente. Para Françoise Héritier nesta, mesma publicação, os nazistas preconizavam que os judeus eram sub-humanos, animais de rebanho, e por isso não era um problema serem eliminados. No que tange ao contexto atual, como se pode ver isso na política e nos possíveis inimigos colocados como não-humanos e não pessoas? Bronislaw Geremek arremata neste mesmo Foro Internacional sobre a Intolerância: “Não existe povo intolerante, xenófobo, ou antissemita, por natureza. Nas multidões emudecidas pelo ódio, pela intolerância, vemos, sobretudo gente cansada, ansiosa e desesperada. A intolerância, o ódio, podem manifestar-se tanto nos tempos de crise como na prosperidade. Na verdade, eles exprimem o desespero, a inquietação com a identidade, exprimem uma rejeição ao mundo em que se vive”. Como a educação para os direitos humanos e a escola, lócus privilegiado de discussão dos saberes fundamentais para o indivíduo, podem contribuir neste debate? A partir da valorização da Ciência e não a sua negação, do reconhecimento do contraditório, da antítese – promotora da lógica dual e do questionamento – do respeito à cidadania e a alteridade – diálogo com o diferente – apontando a beleza da diversidade e combatendo a desigualdade de condições. Os movimentos sociais, os sérios veículos de comunicação e a participação popular nas ruas serão essenciais neste processo de garantia dos direitos fundamentais que devem ser defendidos por uma educação plural.

*Professora da Faculdade de Educação da Universidade do Estado de Minas Gerais – FaE/CBH/UEMG. E-mail: alinechoucair@yahoo.com.br


Imagens de destaque: Montagem de fotos com Joseph Goebbels (esq.), ministro da propaganda nazista de Hitler (Foto: Bundesarchiv Bild/ Weekimedia), e Roberto Alvim (dir.), secretário de Cultura brasileiro em janeiro de 2020  (Foto: Valter Campanato/Ag.Brasil)

 

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