Educação e direito à infância: pelo reconhecimento da criança como sujeito de direitos

José Heleno Ferreira

No último mês de setembro, diversos meios de comunicação noticiaram o fato de que escolas privadas, em várias localidades do país, têm oferecido aulas de empreendedorismo às crianças. Noticiaram, inclusive, que essa oferta se dá cada vez mais cedo. Uma escola da cidade de São Paulo chega a oferecer aulas de empreendedorismo para crianças a partir dos três meses de idade. Outras escolas oferecem imersões em mandarim, uma vez que as crianças devem se preparar para as mudanças que podem vir a acontecer no mercado internacional.Outras, ainda, divulgam o ensino de línguas e o domínio das mais avançadas tecnologias já na primeira infância. Obviamente, ofertas como estas têm como público alvo um determinado e seleto grupo socioeconômico, o que se percebe pelas mensalidades – em torno de dois a seis mil reais mensais – cobradas pelas escolas de ensino fundamental que oferecem tais atividades.

Crianças criativas, resilientes, dinâmicas, produtivas, empreendedoras! Futuros homens e mulheres de negócios.

Ausente de toda esta propaganda está justamente a criança, o direito à infância, à brincadeira livre e desinteressada, à explosão do riso e do choro, à euforia e ao recolhimento ao colo nos momentos de sono e cansaço.

O exercício da infância, direito fundamental que precisa ser garantido a toda e qualquer criança, é negado. Crianças e adolescentes são percebidos como um futuro a ser construído – nos moldes do capitalismo ocidental e da valorização do trabalho, da eficiência, da produtividade e do lucro. O direito ao lazer, incluído no artigo 6º da Constituição Federal de 1988, bem como no Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), nos artigos 58 e 59, é sumariamente negado. O que se observa é uma busca desenfreada pela preparação das crianças para que estejam, o mais rápido possível, aptas a exercerem a liderança no mundo do trabalho. E, para isso, crianças e adolescentes devem, então, ser objetos de uma constante disciplinarização, afinal, são seres imaturos, lúdicos, desregulados, inapropriados para o mundo do trabalho dentro do modelo capitalista.

Esta é a lógica que impera no mundo ocidental: a valorização do humano a partir do que ele é capaz de produzir. A mesma lógica que norteia o debate acerca da demarcação de terras indígenas, as decisões acerca da exploração das riquezas minerais, a liberação de agrotóxicos que permitam uma maior produtividade agrícola… enfim, medidas que têm como princípio e justificativa a questão econômica. Os resultados desta forma de pensar e organizar a sociedade são conhecidos: a desigualdade social, a miséria e a privação dos direitos fundamentais para a imensa maioria da população, a concentração de riquezas nas mãos de cada vez menos pessoas.

Quando a lógica empresarial se torna o norte dos processos escolares e educativos e dos processos de formação humana de forma geral, algo muito grave está acontecendo. O que está sendo negado é a dignidade humana como direito básico de todos e todas. O que está sendo dito é que o valor da pessoa humana poderá ser medido ou definido pela sua capacidade de produzir ou por sua criatividade empreendedora.

Embora, como já dito, tais propostas curriculares sejam destinadas a um determinado grupo social, é preciso reconhecer que tal lógica se faz presente também nas escolas públicas nas periferias dos grandes centros, nos pequenos municípios, no campo e na cidade. E o caráter perverso de tal lógica educativa se manifesta justamente na culpabilização das crianças pobres – que são levadas a acreditar que são pobres por não serem suficientemente empreendedoras, criativas, resilientes.

Talvez seja o momento de repetirmos, com Charles Chaplin, em O Grande Ditador, que mais do que de máquinas, precisamos de humanidade, mais do que de inteligência, precisamos de gentileza e bondade. Ou, ainda, talvez seja o momento de evocar os versos do mineiro Milton Nascimento e pedir que nos dê a mão o menino, o moleque que mora sempre nos nossos corações.


Imagem de destaque: Chelsea Aaron / Unsplash

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