Educação Brasileira: os desafios do novo Ministro

A escolha do prof. Renato Janine Ribeiro para comandar o Ministério da Educação foi uma grata surpresa que ultrapassa em muito o campo educacional. Observador arguto da realidade brasileira, teórico refinado e de reconhecida erudição, Renato Janine transfere ao ministério Dilma certa aura de idoneidade e permite pensar que a época da balcanização da educação pode ter sido superada neste governo.

Indicado, certamente o novo Ministro já começou a mapear os seus grandes desafios na pasta. E estes, como sabemos, não são poucos.  Em primeiro lugar, há que se reconhecer que o próprio Ministro precisa aprender mais sobre a educação brasileira, sobretudo a básica, se quiser governar com os professores e com os movimentos sociais que disputam o sentido da educação no espaço público. A sua competência no campo da filosofia, do pensamento social brasileiro e, mesmo sobre ensino superior e sobre pós graduação, não o capacita, por si só, para dirigir o mais amplo e complexo serviço público do estado brasileiro: a educação básica.

Em segundo lugar, já falando de seu plano de governo da educação, nele não pode faltar um compromisso inarredável com a execução do Plano Nacional da Educação. Nesse terreno, não há que se inventar nada. O grande desafio é mobilizar as estruturas de Estado e a sociedade civil brasileira para implementação do Plano, de suas Metas e Estratégias. Em terceiro lugar, e na mesma direção posta acima, é preciso que o MEC deixe para traz a tradição, já quase centenária, de campanhas e planos pontuais e mirabolantes e articule políticas contínuas e bem estruturadas que visem o enfrentamento dos obstáculos estruturais que impedem a elevação da qualidade da escola pública básica no Brasil.

Qualquer plano de governo da educação fracassará se não foi ancorado, se não tiver como prioridade absoluta, a valorização dos professores e professoras da escola básica brasileira. E, obviamente, não estamos falando que devemos intensificar ainda mais os inúmeros programas de formação de professores, por mais que estes sejam importantes. Estamos falando, isso sim, de construirmos carreiras, de pagarmos salários e criarmos condições de trabalho dignas do e para o professorado brasileiro. Professor da mais importante universidade brasileira que é, o Ministro bem sabe que essas três condições são primordiais para manter a USP entre as melhores do mundo, e, certamente, sabe também que o mesmo se aplica à escola básica.

Em quinto lugar, o novo Ministro não poderá descuidar do sistema federal de ensino superior. A rápida expansão propiciada pelo Reuni e, agora, o corte de verbas para a educação – que a crise econômica, os problemas da Petrobrás e a queda do preço do petróleo no mercado internacional, dentre outros, deixam entrever que não será passageiro – criam um barril de pólvora a ameaçar a manutenção dos níveis de qualidade das universidades federais, as principais responsáveis, ao lado das estaduais paulistas, pela produção de conhecimentos científicos e tecnológicos no país.

Mas não menos importante será, também, que o Ministro volte seu olhar para a rede de Institutos Federais de Educação Tecnológica criada recentemente e ainda em implantação no país. Assegurar a sua efetiva operacionalização é um grande desafio. Mas será desafiador para o ministério assegurar que tais Institutos venham a cumprir a sua missão institucional de formação técnico-científica e não sejam capturados, seja pelo seu corpo docente em direção à cultura acadêmica das universidades, seja pelas classes médias locais em direção à preparação de seus filhos para prestar o ENEM em condições mais favoráveis do que o conjunto da população brasileira.

Pensamos, ainda, que o Ministro deveria cuidar mais do que seus antecessores da constituição de Redes e Programas de Pesquisa que tenham uma vinculação direta com as necessidades de conhecimentos postas pelas práticas dos professores e pela gestão das políticas educacionais. Um sistema e um serviço de tamanha extensão e complexidade não podem ser geridos e praticados amadoristicamente. Essa articulação entre a pesquisa e a escola básica e os impactos positivos que dela se espera, não se faz com editais erráticos e sem diálogo com o que já se sabe e com o que já se conhece da realidade educacional brasileira.

Finalmente, mas não menos importante, é preciso que o Ministro enfrente o desafio de repactuar a relação do Estado brasileiro com a iniciativa privada, no campo da educação.  Não é mais possível tolerar o repasse de recursos públicos para a iniciativa privada em educação no montante em que se faz no Brasil e, ademais, sem que as mantenedoras e/ou empresas privadas que se ocupam do setor demonstrem maior preocupação com a qualidade do ensino ofertado às nossas crianças e à juventude.

Diante desses desafios e de muitos outros que não foram aqui elencados, resta saber se o novo Ministro terá a humildade para aprender com aqueles que sabem sobre a educação, se conseguirá frear o ímpeto de “criação de novidades” que assalta a quase todos que passam pelo ministério, se terá capacidade e disponibilidade para dialogar franca e abertamente com os ocupantes das próprias estruturas de Estado e com os movimentos sociais diversos que disputam a educação, se conseguirá mobilizar as estruturas de Estado e a sociedade civil brasileira em torno de um tema que há muito os setores mais ricos e de classe média brasileiros renegaram: a qualidade da escola pública como um direito social e uma condição para a vida democrática. Se conseguir isso, certamente estaremos criando as condições para uma efetiva contribuição da educação pública ao desenvolvimento científico, cultural, econômico e social dos brasileiros e das brasileiras.

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