Despadronizando a infância e rompendocom a ideia de uma criança do sucesso

Marcelo Silva de Souza Ribeiro

A contemporaneidade tem sido marcada pela intensificação da lógica de mercado que adentra profundamente nossas existências. Nesse contexto, as crianças têm sido também alvo de demandas atravessadas pela eficiência, eficácia, produtividade, resultados, metas, competição e sucesso. Há uma espécie de frenesi para que as crianças acelerem seu desenvolvimento, antecipem aprendizagens e se ocupem ao máximo com toda sorte de produtos educativos (EYER; HIRSH-PASEK; GOLINKOFF, 2006). Os pais esperam que essas crianças estejam bem preparadas para o mundo (o mercado), sendo competitivas e galgando o tão sonhado sucesso.

Importante observar que essas “crianças do sucesso” fazem parte de determinadas classes sociais e as que ocupam as menores estratificações, as mais pobres e chamadas “crianças da ralé”, vivenciam outras situações (a expressão “crianças da ralé” é uma analogia ao termo “ralé brasileira”, alcunhada por Jessé Souza em 2017. Sobre isso, abordaremos numa outra oportunidade).

Acontece que as “crianças do sucesso” têm suas infâncias forjadas pela padronização que se origina pela ideia de sucesso e, portanto, controle de qualidade para atender ao deus exmachine do mercado. É a ordem da padronização que estabelece os critérios basilares da lógica do mercado à medida que possibilita hierarquizar, comparar, criar metas, controlar (a qualidade e quantidade) e, finalmente, competir. Os modelos que balizam como as crianças devem ser, o que precisam galgar e o que vão aprender são imperativos do controle social contemporâneo e que tentam impor os sentidos e significados constituidores da infância (ou mesmo a negação da infância). Nesse sentido, os pais, as escolas e demais instituições têm exigido a extração de recursos desenvovimentais das crianças para atingir altos índices performáticos apoiados pela ordem da padronização.

As crianças sentem o peso dessas excessivas cobranças performáticas e, por vezes, se expressam (como os adolescentes) via a depressão e a vontade de não viver. Outras vezes, as crianças não conseguem entrar no “controle de qualidade” e, portanto, são rechaçadas. Nesses casos são patologizadas e medicadas.

Despadronizar a infância é, portanto, reconhecer as singularidades do desenvolvimento das crianças, é garantir o direito do brincar por brincar e do tempo livre, é confirmar as suas indeléveis diferenças e é romper com a ideia de “criança do sucesso”. Isso porque a existência da criança e a experiência da infância não podem estar subordinadas aos ditames de um ideal competitivo que estabelece, rigidamente, o que e como devem ser, sob pena de contribuir com os seus adoecimentos e até mesmo com suas mortes.


Referência:

EYER, Diana; HIRSH-PASEK, Kathy; GOLINKOFF, Roberta Michnick. Einstein teve tempo para brincar: como nossos filhos realmente aprendem e porque eles precisam brincar. Rio de Janeiro, Guarda-chuva, 2006.

SOUZA, Jessé. Elite do Atraso: da Escravidão à Lava Jato. Rio de Janeiro: Leya, 2017.

Imagem de destaque: Robert Collins / Unsplash

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