Cuidar da terra ou para não passar a boiada

Dalvit Greiner

Hannah Arendt chamou nossa atenção sobre a violência humana. E ela tem razão em tudo o que disse. Porém, como a gente se debruçou sobre a questão da violência política (e agora, mais que nunca, isso nos assusta), deixamos de lado a sua assertiva em relação à Terra. Nossa relação com a Terra é muito violenta. E essa violência com a Terra é resultado da política que fazemos. O Capitalismo maximizou essa relação violenta principalmente na medida em que não repõe em absolutamente nada a quantidade mínima do que explorou. Nossa relação, individual e coletivamente, não pode ser essa. Precisamos mudar e é urgente.

O Capitalismo sobrevive ao fazer da terra um meio de reprodução da mais-valia. Para explorar o homem e a terra sua primeira ação foi acabar com a relação natural entre o homem e a terra. Uma relação afetiva, de pertencimento. Com isso, não vamos romantizar a relação de uso exaustivo da terra pelo homem ao longo da história. Porém, com o conhecimento que temos hoje e das formas de recuperação do solo é possível alimentar todos os homens dessa terra sem depredá-la ou abandoná-la. O problema está no fato de que a terra não mais pertence a quem está sobre ela. A Terra não pertence aos seres vivos, mas ao Capital.

Nessa relação capitalista em que vivemos o agronegócio sobrevive de matar o homem e a terra. E para isso precisa cada vez de mais terra e de menos homens. O agronegócio brasileiro encontrou em seu caminho não apenas a floresta, mas o homem que lá habita. O primeiro argumento é uma equação matemática pífia que não sobrevive a um argumento humano. Não é  a densidade populacional que manda nessa relação terra-homem. Não é o seu valor de troca, mas o seu valor de uso. A ideia do atual ministro do Meio Ambiente Ricardo Salles de “passar a boiada” é criminosa, na medida em que não age como um homem de Estado deveria agir: pensando no futuro do país e da humanidade. É uma ideia egoísta de quem vê apenas o seu bem-estar. O agro não é pop. O agro é elite. Uma elite que bebe leite tomado à força de quem o produziu.

Precisamos, também controlar toda forma de mineração: sim, é preciso ser radical. O Portal da Mineração elenca cinco razões pelas quais não se pode viver sem mineração. Um texto muito agressivo e pouco didático. Mas, eles tem razão em todas as suas razões lá expostas. Quando entramos na Idade do Ferro já fazíamos mineração há muito tempo, porém não o fazíamos dentro de um sistema capitalista de terra arrasada. Precisamos controlar toda forma de mineração porque mineradoras não tem o poder de reconstruir a Terra. Modificado o ambiente pela mineradora torna-se uma situação de inevitável “para sempre!” Nunca mais você verá aquele espaço em sua natureza. E, por isso, ouso dizer que toda e qualquer prática de mineração deve ser retirada da iniciativa privada. O Capitalismo não tem nenhuma responsabilidade com o futuro na medida em que seus entes privados morrem. Empresas morrem e as mineradoras não escapam a isso.

Nossos índios e ribeirinhos, pequenos agricultores, quilombos, Movimento dos Trabalhadores Sem-terra são guardiões da Terra. A sua relação com a terra é de amanho: de lavrar cuidando e viver criando ali uma memória, um culto. Não são predatórios, pois sabem de nossa fragilidade dentro do planeta. Por isso, nenhuma relação com a Terra pode ser capitalista na medida em que a mesma é um bem global, coletivo e, portanto deve ser cuidada. Muito bem cuidada, pois não existe outra. Nem para os ricos.


Imagem de destaque: Secom_Prefeitura de Salvador

 

 

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