Apontamentos sobre a crise na educação das novas gerações – exclusivo

 Elaine Teixeira Pereira

 

Vivemos num país em crise. Esta é a afirmação que tem circulado nos discursos dos mais variados agentes sociais. Em grande parte desses discursos, a visão é bastante reducionista, ao circunscrever a crise no âmbito econômico, como privilégio do Brasil, responsabilidade de um governo e de um partido político. Aliás, em nosso tempo parecem multiplicar-se as pseudo-análises, em que todos opinam – como especialistas e de forma um tanto intolerante – sobre quase tudo.

Um primeiro ponto a considerar é a responsabilidade que temos, como educadores, em buscar olhar os fenômenos de forma mais ampla e profunda. Assim, diante de uma realidade complexa, não deveria ser possível uma análise simplista. E nesse caminho de qualificação e sensibilização do olhar, a história, a sociologia, a filosofia, podem certamente contribuir.

Uma das crises que vivemos, e que precisa estar em pauta, é a crise da educação. E aqui me refiro não apenas aos mais variados problemas enfrentados diariamente nas/pelas escolas brasileiras, mas à crise na educação falando de forma mais ampla – que ultrapassa o ambiente escolar, mas não o exclui.

A crise na educação parece estar relacionada a outras crises, como a crise da autoridade e das instituições. Pensemos na família. Grande parte dos adultos, por exemplo, parece não se propor a assumir sua função de condução das novas gerações, recusando a autoridade e a responsabilidade para com aqueles que trouxeram ao mundo. Não raras vezes tenho percebido os responsáveis pelas crianças eximindo-se de seu papel, delegando a elas uma função que é deles. Nos mais variados espaços, as cenas de adultos pedindo permissão às crianças para algo que precisa ser feito e que não deveria ser opção; não tendo ação quando elas se negam a fazer o previamente encaminhado e combinado; deixando que façam o que desejam mesmo quando tal situação as coloca em risco, multiplicam-se numa velocidade e regularidade surpreendentes.

Nunca é demais, ao tratar de um assunto tão delicado quanto este, esclarecer que a proposta não é de um “massacre” às crianças e jovens. Não se trata de defender o autoritarismo ou combater a autonomia, tampouco desconsiderar que as crianças sejam sujeitos de direitos. Ao contrário, concebê-las como sujeitos humanos de pouca idade que têm direito à proteção, à provisão e à participação, inclui a afirmação de que devem ser protegidas, mediadas, numa relação que não pode prescindir de limites. Administrar, encaminhar, lidar com tais limites, num contexto em que a autoridade e as instituições encontram-se em crise, é mesmo um grande desafio.

Paralelamente à postura que quase tudo permite (e muito provavelmente relacionado a ela), é possível identificar outro fenômeno: diversos discursos (orais e escritos) demonstram que não temos mais “meninos” e “meninas”, mas “príncipes” e “princesas”. A quantidade de vezes em que estes substantivos são utilizados por adultos ao se referirem às crianças por eles amadas, ou que de alguma forma lhes inspiram ternura é, no mínimo, alarmante. O que se está dizendo com a escolha dessas denominações? O que significa ser um “príncipe” ou uma “princesa”? O que há de registro em nosso imaginário quanto a estes termos? Ser “príncipe” ou “princesa” diria de alguém que, como centro das atenções, faz valer suas vontades e tem seus desejos atendidos – quase que independentemente dos outros e do mundo?

Por mais meninos e meninas. Por mais educação. Por mais responsabilidade de nossa parte para com as novas gerações. Que possamos amar, cuidar, conduzi-las com respeito e empatia. Que possamos ter clareza e coerência para contribuir com seu processo de apropriação do mundo, numa relação fundada na responsabilidade, na segurança e na construção da autonomia.

 

Florianópolis, maio de 2016

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