A universidade e seus currículos: por uma leitura humanista V

Roberto Rafael Dias da Silva

Para finalizar minha série de estudos sobre a temática do lugar das Humanidades nos currículos dos cursos de ensino superior na atualidade, neste texto pretendo estabelecer uma aproximação ao conceito de “humanismo”. Em diálogo com meus leitores, ao longo deste semestre, julguei conveniente traçar um horizonte de compreensão para esta noção e, para tanto, escolhi basear-me em um artigo escrito pelo sociólogo Richard Sennett e publicado na revista The Hedgehog Review em 2011.

Nas últimas décadas nossa relação com o trabalho tem se caracterizado pelo curto prazo, pelas inovações permanentes e pela competitividade. Como estratégia de reação crítica a este cenário, Sennett escolheu retomar o projeto humanista, tal como foi desenvolvido no período renascentista por pensadores como Pico della Mirandola. De acordo com o pensador, Deus – enquanto um Mestre Artesão – criou o ser humano na condição de uma obra indeterminada. Através desta condição, “o ser humano tem de buscar a unidade em sua própria vida; a pessoa tem de se tornar coerente”. No humanismo renascentista, como lembra-nos o sociólogo, era necessário aprender a buscar unidade na diversidade, construir uma narrativa de vida coerente e tornar-se o narrador de sua própria vida.

No decorrer dos últimos anos, o capitalismo inviabilizou esta formação humanista. As mudanças constantes enfraquecem as possibilidades de uma narrativa coerente.

O fluxo do tempo enfraquece suas forças de narradores; só conseguem ver pequenas partes de suas vidas no trabalho. Sem uma noção clara de como estruturar o trabalho no tempo, as pessoas ficam confusas, quando não depressivas, quanto ao que devam fazer. O próprio local flexível de trabalho parece ilegível; o caráter camaleônico das organizações, por exemplo, faz as pessoas terem dificuldade de calcular o que possa ocorrer se mudarem de emprego.

Importante constatar que quando o trabalho torna-se “ilegível”, reduz-se o comprometimento do trabalhador. Provoca-nos o sociólogo: “como ser leal a uma corporação volúvel?”. É como alternativa a este cenário que Sennett insiste na importância de revisitarmos o humanismo renascentista, em busca dos modos pelos quais as oficinas convertiam-se em espaços de experimentação. Ao mesmo tempo, a convivência com o diferente e a promoção de cooperação (informal e ilimitada) serviam de inspiração para novas relações com o trabalho e com a vida.

A aposta em práticas cooperativas apresenta-se como alternativa aos caminhos profissionais hoje predominantes. Para tanto, Sennett defende o uso do rótulo “humanista” enquanto “um símbolo de honra e não a denominação de uma visão de mundo esvaziada”. Distanciando-se de um tom nostálgico, o sociólogo defende que o humanismo se trata de um projeto a ser realizado” (SILVA, 2015) e seus valores servem de medidas de apreciação da sociedade contemporânea, capazes de potencializar outros modelos de formação humana. Assim sendo, encerro esta série de reflexões sobre o lugar das Humanidades nos currículos dos cursos de graduação, considerando que sua pertinência e atualidade encontram-se na possibilidade de construção de uma leitura crítica e criativa da condição humana no século XXI.

 

Referências:

SENNETT, Richard. Humanism. The Hedgehog Review, v. 13, n. 2, p. 21-30, 2011.

SILVA, Roberto Rafael Dias da. Sennett & a Educação. Belo Horizonte: Autêntica, 2015.

Imagem de destaque: @natcatalyst

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