A produção de artigos científicos como instrumento para uma visão crítica das desigualdades regionais

Sidclay Cordeiro Pereira*

Como a universidade pode contribuir para a comunidade onde está inserida? O que pode fazer um graduando além de cursar componentes curriculares? Essas são questões refletidas nos corredores e salas de qualquer instituição que preze por uma educação inclusiva e engajada com as mudanças sociais necessárias para uma vida melhor. Mas sair da reflexão para a ação nem sempre é fácil.

Nesse sentido, o curso de licenciatura em Geografia da Universidade de Pernambuco, em seu Campus de Petrolina (interior de Pernambuco) vem, sistematicamente, produzindo ações que buscam envolver a comunidade em suas pesquisas, bem como proporcionar uma devoluta dos seus resultados. Entretanto, por mais que os docentes se esmerem em um trabalho inclusivo, esbarram nas limitações de tempo para orientar tantos estudantes e de investimento, cada vez mais escassos em tempos de cortes na educação pública. Com isso, dezenas de alunos, principalmente aqueles que trabalham para manter-se na universidade, não têm acesso às experiências da pesquisa acadêmica ligadas à Iniciação Científica, ficando de fora de uma parte significativa da construção do conhecimento na academia.

Vivenciando esse árduo contexto, procuramos desenvolver uma prática que pudesse aliar a observação crítica do cotidiano e a produção do conhecimento acadêmico para a comunidade.

Assim, inserimos a produção de artigos científicos como parte dos processos avaliativos e culminância das atividades desenvolvidas em dois componentes curriculares da nossa graduação, a saber “Região e Regionalização” (5º período) e “Geografia Regional do Brasil” (6º período). No primeiro componente, damos atenção às discussões polissêmicas. No segundo buscamos associar às teorias estudados ao cotidiano, ou como entendemos, ao espaço vivido de cada um, numa perspectiva multiescalar.

Os objetos de estudo de cada pesquisa são escolhidos pelos próprios alunos, a partir daquilo que desperta seus interesses desde que estejam dentro do que se vivencia nos componentes curriculares. As orientações ocorrem nos encontros semanais em sala de aula, onde disponibilizamos 1 hora para orientação quanto a estrutura e normatização de um trabalho acadêmico e 3 horas de orientação com cada equipe. Os trabalhos de campo são realizados nos fins de semana e as visitas a órgãos estatais ou privados que sejam de interesse da pesquisa são agendados de acordo com as possibilidades dos estudantes. A cada novo encontro em sala, sistematizamos o que vem sendo coletado. Essa prática também recebe a ajuda imprescindível de colegas docentes, tanto durante o processo de pesquisa quanto na sua avaliação.

Após três semestres, nossos estudantes produziram artigos que discutem temáticas distintas entre si, mas são extremamente pertinentes para a comunidade. Com isso, tivemos artigos que tratam da gestão dos recursos hídricos no Município de Petrolina (PE) na perspectiva da Lei de Águas; a requalificação do espaço urbano em bairros periféricos de Juazeiro (BA); a centralização e consequente segregação no uso dos serviços públicos e privados de saúde em Petrolina; as representações territoriais do semiárido brasileiro na visão estatal e como isso influencia a formulações de políticas públicas de desenvolvimento regional; a conquista do território e a resistência de uma comunidade quilombola no Município de Casa Nova (BA); o processo de mercantilização do ensino superior brasileiro e sua espacialização em Petrolina e as parcerias público e privadas na instalação de grandes corporações multinacionais no estado da Bahia.

As temáticas distintas evidenciam a riqueza do olhar de quem tem a liberdade e a criticidade para entender o seu entorno, assim como destaca a Geografia e o seu protagonismo nas análises regionais e territoriais objetivando problematizar, denunciar e contribuir propositivamente para uma sociedade menos desigual.

A resistência inicial dos alunos, muito em função da apreensão sobre o novo ou sobre a aparente pressão de produzir um artigo logo dá lugar a um envolvimento incondicional ao trabalho. Quando os alunos têm liberdade para associar o que estudam ao que observam, vem à tona uma das maravilhas da prática docente: poder despertar o interesse por uma pesquisa inserida nas demandas sociais.

A região do vale do São Francisco não é o oásis do sertão como as propagandas pró-agronegócio apregoam em busca de sensibilizar o capital nacional e estrangeiro e mão de obra qualificada e barata. Entretanto, por conta da dinâmica regional que contribui para uma desigualdade crescente, permite pesquisas com diversos olhares e abordagens.

Objetivamente, os artigos produzidos têm servido como base para trabalhos de conclusão de curso, bem como são apresentados em eventos acadêmicos. Entretanto, a maior contribuição dessa prática é permitir a vivência da pesquisa com seu rigor acadêmico e a liberdade de construir conhecimento a partir das demandas da sociedade.

O contexto brasileiro atual faz urgir uma universidade que saia dos seus muros e grades e dê liberdade para que mais estudantes explorarem as benesses do aprendizado da pesquisa acadêmica e busquem as demandas locais para nortear suas produções. Podemos fazer isso contribuindo com a formação de profissionais que observem o seu lugar e produzem conhecimento a partir dele.

A prática da produção dos artigos é sempre avaliada positivamente pelos estudantes que a desenvolvem e pelos docentes que a acompanham a avaliam. Mais artigos estão por vir.


*Licenciado e Mestre em Geografia pela Universidade Federal de Pernambuco, Doutorando em Ciências Geográficas pela Université Laval (Quebec, Canadá) e Professor Assistente do Colegiado de Geografia da Universidade de Pernambuco Campus Petrolina. (sidclay.pereira@upe.br).

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