A classe dominante e a censura decorrente do racismo estrutural nas escolas

Tiago Tristão Artero

Nestes dias sombrios, a atualização dos métodos de enfrentamento é fundamental. Entender que, desde a chegada dos portugueses, a cultura do povo vivente no território que hoje é o Brasil foi negada e amputada. Para tanto, foram enxertadas novas práticas sociais e imposta uma cultura considerada legítima.

Na busca por um Brasil moderno e civilizado, os escravizados negros e indígenas tiveram que assumir um papel de subalternidade. Ocorre que no intento de atender as filhas e filhos de imigrantes (alemães, italianos, franceses, portugueses, dentre outros) escolas foram criadas, muitas delas com caráter religioso, confessional.

Este fato não só reforçava, mas determinava uma cultura considerada correta e digna de ser seguida.

Assim, as negras, negros, índias e índios foram considerados menos capazes e suas culturas, inferiores. Isso promoveu um processo de exclusão.

Onde estavam (e onde estão) as escolas para os filhos dos escravizados?

Diversos governos inseriram políticas que aplicaram meios de, supostamente, civilizar os indígenas, por exemplo, atacando sua cultura e valorando a cultura branca como superior.

No interior das escolas, privadas e públicas, ocorre o seguinte fenômeno: a afirmação das práticas religiosas ligadas à elite advém da necessidade de colocá-la como superior em relação às práticas religiosas dos indígenas e afro-brasileiras. Estas últimas são consideradas como uma ameaça à cultura dos colonizadores.

Esse mecanismo se manifesta numa “singela” oração realizada no início das aulas, sob o pretexto de que o “Pai Nosso” é universal. Claro, uma mentira mesclada com violência racial e de classe.

Os conteúdos, igualmente às práticas religiosas, são censurados, dado que somente a visão dos colonizadores é retratada nos livros didáticos (e nas tais apostilas). Longe de não reconhecer a importância histórica e social das escolas, é preciso rever, de maneira urgente, a ideologia das elites praticada em seu interior e, pior, considerada oficial, legítima.

A Geografia (e a própria História), por exemplo, desconsidera o Caminho de Peabiru, fundamental para a criação de São Paulo e para inserir a perspectiva indígena como conteúdo “oficial”. Essa mesma Geografia ameniza os aspectos do capitalismo na geração de pobreza e morte, deixando de lado a financeirização de nossas práticas sociais, em detrimento da vida humana.

A História desconsidera que o que se conta, oficialmente, sobre as revoltas e revoluções ocorridas no Brasil, é extremamente parcial e não retrata o ponto de vista dos indígenas e negras e negros dizimados nestes eventos (tanto quando estavam “ao lado” dos colonizadores, quanto quando eram atacados).

A Educação Física supervaloriza as práticas euro-estadunidenses, colocando os esportes e a competição como fundamentais no currículo e fazendo com que as lutas, as danças, os jogos e as inúmeras práticas corporais dos “colonizados” nunca tenham espaço no ambiente escolar. Portanto, a estética que predomina e a forma considerada correta de expressar-se corporalmente tornou-se, equivocadamente, a do colonizador.

Todas as outras áreas do conhecimento abordadas nas escolas brasileiras (e não só nas brasileiras) menosprezam, a olhos vistos, a vastidão dos saberes e a riqueza das formas de organização social dos povos que, por diversos motivos, foram e são considerados inferiores.

Temos que praticar a autocrítica e notar que não conhecemos a riqueza da Química das plantas (utilizadas, há milhares de anos por nossos ascendentes negros e indígenas) e a complexidade da Matemática e de suas aplicações.

A pergunta que fica é: como retomar as identidades que foram apagadas, em especial dos que aqui já estavam (indígenas) e dos que para cá foram trazidos (escravizados da África)?

Estas identidades, práticas e conteúdos foram e continuam sendo censurados, pois não refletem os interesses da classe dominante. Um exemplo são as religiões exaltadas e consideradas legítimas dentro de instituições de ensino.

Nem mesmo em escolas que não temos, em sua maioria, alunas e alunos brancas e brancos, ou em escolas situadas em região com população indígena significativa, pode ser escutado uma oração da Umbanda, do Candomblé, um Saravá, ou uma saudação aos Espíritos dos Antepassados e às Forças da Natureza.

Mas, todos os dias, vemos escolas bradando, sem nenhum pudor, um vigoroso “Amém” ou cantando hinos com motivos de Guerra. Por isso, é possível afirmar que o racismo é estrutural, pois está no cerne das nossas instituições e das nossas práticas.

Como criar mecanismos para resgatar e respeitar a forma de comer, de falar, de praticar seus rituais e, também, de resgatar elementos da cultura dos nossos ancestrais que, violentamente, foram retirados de seu cotidiano?

A escola, em seu papel de socializar o conhecimento, formar conceitos e permitir que novas práticas sociais sejam viabilizadas, precisa incorporar o entendimento de que não pode tornar-se reprodutora e legitimadora das contradições advindas dos interesses da elite. Pelo contrário, precisa ressignificar-se não somente na aparência (na forma, nos métodos pedagógicos), mas na essência… na superação das mazelas que o capital promove.


Imagem de destaque: Reprodução/Carta de Belém

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