Construindo outras narrativas midiáticas

Foi realizada ontem na Faculdade de Educação a abertura do XII Seminário Anual do Pensar a Educação Pensar o Brasil. Neste ano o seminário traz como tema “Mídias, Educação e Espaço Público”. O primeiro convidado foi o professor Nelson Pretto da Universidade Federal da Bahia que realizou a conferência “Educadores-intelectuais públicos: construindo outras narrativas“.

Nelson Pretto iniciou sua fala questionando o espaço institucional da universidade na contemporaneidade em sua concepção. Nelson Pretto citou o livro do Felipe Serppa ”Rascunho digital”, em que define este espaço como uma coorporação de estudiosos regidos pelo princípios de democracia e autonomia, responsável por abrigar a polissemia de saberes do conhecimento. Essa concepção apresentada pelo professor se dá pelo diagnóstico de que a universidade como espaço de cultura está se perdendo no contemporâneo. E propõe pensarmos no intelectual público a partir de uma concepção radical do pensamento, ou seja, da atuação no espaço público.

Para Nelson Pretto a perda da rebeldia deste espaço significa a perda da possibilidade de outras narrativa. Neste sentido, propõe que o reencantamento da universidade passa essencialmente pela superação de desafios conceituais  em sua relação com outros saberes, ou seja, superar os processos de cientificidade. E o reconhecimento dos movimentos contraculturais fortalecidos pela rede: capacidade de compartilhar a produção do conhecimento (ciência aberta em perspectiva cidadã) e da abertura dos processos de produção do conhecimento.

Esta proposta, na concepção do conferencista, apresenta desafios que estão relacionados especialmente com a relação educação e mercado. Nelson salientou que essa relação atinge níveis acadêmicos especialmente ligados a noção de produtividade científica com seus sistemas de avaliação. Esse contexto é especialmente sensível uma vez que houve uma guinada das políticas educacionais encaminhadas por reformadores empresariais após a consolidação do golpe politico-jurídico-midiático. Ele ressaltou que as ultimas mudanças em nossas legislação educacional, como a reforma do ensino médio, foram encaminhadas no sentido de definir princípios das políticas educacionais regidos por dinâmicas de mercado.

Além deste desafio, Nelson também salientou o desafio da concentração e vazio de comunicação no Brasil. Este quadro desequilibrado entre apagão e concentração de mídias, ainda faz parte da paisagem geográfica no país. Em suas palavras, a concentração de mídias gera concentração de audiência, propriedade cruzada e concentração de poder midiático em quatro principais grupos de comunicação que estão internacionalmente articulados com outros grupos.

Nelson compreende o meio digital, como os blogs, como possibilidade de produção de outras narrativas. Ele ainda salienta que em muitas cidades a existência desses canais possibilitam a comunidade se ver, além de exercer controle público da ação de agentes e representantes do Estado. Ainda assim Pretto não deixa de defender os sistemas públicos de comunicação e sua fundamental importância para um país democrático. Estes espaços possibilitam a construção de narrativas diferentes das grandes mídias.

Nelson Pretto pontuou como a educação está nas grandes mídias. Ao falar sobre educação nas mídias é preciso lembrar a presença de grupos reformadores, ligados à iniciativa privada que, através de Ongs, apoiam e pautam grandes grupos midiáticos. O professor salientou a barreira que se coloca no ambiente dos veículos de comunicação em relação aos especialistas que não pertencem a estes grupos. Ele destaca a valorização de certos colunistas e a formulação de pautas que “criam” problemas. Para ele a pergunta “A educação tem solução?” e similares já no seu enunciado condenam ao fracasso todo o sistema educacional.

Para Nelson Pretto a superação deste cenário passa pela importância de assumir uma postura ativista na comunicação. O professor tem papel importante nesse processo e precisa ser um ativista comunicador que atue numa rede difusa de comunicação. Para o pesquisador, um exemplo  são as grandes manifestações de 2013, quando as redes sociais foram à rua. A internet se apresenta como possibilidade de força disruptiva e para o professor existem exemplos desse processo como os blogs Avaliação Educacional, Paulo Carrano e do Pensar a Educação Pensar o Brasil.

Os enfrentamentos que precisamos encarar neste espaço da internet se mostram não só nos ataques, na chamada pós-verdade, mas especialmente no crescimento do poder das grandes corporações (Google, Amazon, Facebook e Apple – GAFA) que com seus algoritimos atuam nas redes com interesses coorporativos e não com intenções públicas de cidadãs. A chamada ‘navegação pela internet’ é então substituída por muros e cercas dos aplicativos, algoritmos e dados. Os dados passam a ser a grande riqueza das redes, são os rastros dos usos de milhares de pessoas que estão nas mãos de corporações e são vendidos e estudados com interesses financeiros.

Neste sentido a conferência coloca os grandes desafios na construção de outras narrativas: o controle dos dados pessoais, a facilidade de difundir falsas informações e na propaganda política sem transparência. Para o professor, a superação desses desafios passa pela formação de leitores desconfiados e críticos dos processos de produção do conhecimento e difusão de saberes e informações. Os embates públicos necessitam de uma radical transformação, ou seja, assegurar o acesso aberto, ciência cidadã, ampla produção científica, dados abertos e construção coletiva de projetos pedagógicos.

 

 

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