Sobre crises e vulnerabilidades: anotações díspares

Roberto Rafael Dias da Silva

Compreendo que o último dia 30 foi destinado a uma reflexão social acerca dos atuais direcionamentos políticos do Brasil, bem como a ampla mobilização social materializada em um dia de greves e paralisações em todo o país. As pautas mobilizadoras destas iniciativas de organização da sociedade civil permitem-nos pensar sobre as violações de direitos humanos, o declínio da agenda social ou, mais que isso, em torno do futuro da democracia e dos espaços públicos/coletivos de decisão. Todavia, para produzir uma singela contribuição com os debates e lutas instaurados no 30 de junho, escolho outro caminho, qual seja: interrogar as relações entre crises e vulnerabilidades, através de uma recente exposição das obras do artista sírio Abdalla al Omari.

​Em sua exposição, intitulada “The Vulnerability Series”, o artista realiza uma seleção de imagens de alguns dos principais líderes mundiais da atualidade e apresenta-os em retratos ficcionais como se estivessem na condição dos milhões de imigrantes ou refugiados dispersos pelo mundo. O realismo de suas imagens posiciona os personagens de forma distante da sua situação política (de líder mundial) e retrata-os em situações de angústia, desespero ou fuga. Considerando suas experiências pessoais de deslocamento em massa, visto que atualmente está residindo na Bélgica, Omari tomou a pintura na condição de instrumento político capaz de produzir insurgências críticas. Em suas palavras, “eu queria tirar o poder de não me servir da minha dor, mas dar a esses líderes a devolução de sua humanidade e da audiência para saber o que o poder da vulnerabilidade pode alcançar”.

Consideramos a exposição “The Vulnerability Series” na condição de exemplar da luta política contemporânea e, mais que isso, como um catalisador de nossas reflexões acerca das relações entre crises e vulnerabilidades. Com a leitura da filosofia de Judith Butler, recentemente compreendi a relevância de pensar as questões da vulnerabilidade e da precariedade e nos tipos de mobilizações contra essas condições que estão ocorrendo no mundo todo, enquanto assistimos um movimento onde a economia global produz uma desigualdade crescente e torna cada vez mais populações e indivíduos dispensáveis e/ou supérfluos. Butler sugere que “a vulnerabilidade pode estar ligada com mais importância com práticas de resistência do que com pedidos de proteção paternalista”. E, dessa forma, desafia-nos a repensar a relação entre vulnerabilidade e resistência. Para a autora, vulnerabilidade, pobreza e insegurança nos constituem em um posição precária no mundo o que pode nos levara ações de resistência.

​Ainda que a crise seja um importante operador estratégico das políticas neoliberais, como explicam Laval e Dardot, para a filósofa a vulnerabilidade poderia ser um ponto de articulação nos relacionamentos na qual vivemos e as ruas não seriam apenas uma base ou plataforma para uma exigência política, “precisamos da rua e nos mobilizamos para ter a rua. A rua é um bem infraestrutural”. Pensar as relações entre crise e vulnerabilidade, a partir dos escritos políticos de Butler, parece nos oferecer outros elementos para a composição de uma nova pauta política que ultrapasse as formas individualizantes de vida pública, ao mesmo tempo em que nos permita combater a precariedade socialmente imposta a cada sujeito contemporâneo. As pinturas críticas de Omari, condutoras de minha reflexão para as mobilizações de 30 de junho, permitem-nos pensar a política de outros modos!

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