Ruídos e encontros na escola:corpos vibrantes dos jovens e de seus outros

Vanessa de Andrade Lira dos Santos

Sempre me interessaram os ‘ruídos’ na escola, especialmente os juvenis. E esse interesse não pressupõe um ouvido bem ajustado. Está mais para as perguntas que esta experiência me traz. Minha pergunta inicial se dá no próprio fato de não compreendê-los através de uma lógica predeterminada, talvez por essa lógica ser ela mesma anterior aos acontecimentos.

Os ruídos já são perceptíveis fora dos muros da escola. Subindo a rua que dá acesso ao campus sou esbarrada, abraçada, atropelada pelos alunos. Eles falam simultaneamente, gesticulam e movimentam-se comunicando nem sempre o que preveem, ou muito mais do que gostariam. Não posso negar que o ruído ecoa em mim, mudando inclusive meu humor ou meu vigor para o dia que se inicia.

Queria de fato entender claramente todo o acontecimento que me circunda, ali mesmo na subida da rua da escola. Os encontros vão acontecendo ali, em cada esquina, antes mesmo de chegar aos seus portões.

Grupos espalhados das mais variadas formas: sentados na escadaria, nos banquinhos, numa grade que circunda a quadra, nas vias de acesso dos carros dentro do campus. Uns mais discretos, outros aparentemente procurando por alguém. Alguns já correm e gesticulam, acelerados antes mesmo da abertura dos portões, antes das sete horas da manhã.

Na entrada alguns agentes tentam conter o ritmo já frenético dos jovens que entram rapidamente buscando seus caminhos. E nem sempre os caminhos são ordenados como o espaço escolar previa, em sua fundação enquanto ideia. Alguns escapam para os bebedouros, uma, duas vezes antes de fazerem o trajeto para as salas. Outros escorregam para os banheiros, às vezes pra terminar uma conversa que iniciaram lá fora.

Com idas e vindas a entrada nas salas se dá. A partir dali eu devo ser a professora e eles os alunos. Simples assim? Se não fosse pela superposição de vibrações de frequências diversas. Depois de muita observação, uma coisa eu já sei: nem sempre são superposições aleatórias, não fora dos sentidos que damos automaticamente aos acontecimentos.

O que consideramos de fato importante de ser dito e ouvido na escola? O que é de fato ruído, e para quem o é? Se o sentido de transmissão não nos cabe como estratégia única de produzir saberes na escola, o caminho padronizado do conteúdo e da resposta também deveria ser reconfigurado como parte do processo. São inquietações que me passam em muitos dias, assim que atravesso os portões da escola, às vezes antes disso.

A mudança que nos olha não é o que não havia, mas o que agora esgarça os espaços da escola. E talvez eu ainda a olhe pela lente de uma reprodução infinita de leis, por isso ainda me afrontam essas perguntas que parecem não dever caber, ou me caber responder. Mais do que encarar o outro na escola, com tudo que ele tem de alteridade, considerando sempre o nosso ponto de referência, tendemos a produzir representações que o contêm.

Parece ser o caminho mais curto o de olhar ao redor deste outro e produzir para ele um esquema representativo. E é assim que muitos jovens são ‘diagnosticados’ na escola, já que, além de serem cada qual um outro, como todos nós somos, possuem o diferencial de fazer parte de uma geração que sugere mudanças ou respostas diante de sua diversidade.

É o vibrar do outro que muitas vezes causa a sensação de ruído. E o vibrar do outro jovem, que nem sempre se adequa a uma proposta linear dos espaços e mesmo dos saberes escolares, muitas vezes se choca com uma tentativa fixa de ser escola. Trata-se de compreendermos, ainda que parcialmente, as variáveis deste processo de ouvir e de falar, considerando a impossibilidade de uma conclusão fixa deste embate e, ao mesmo tempo, o apontamento diverso e relativo que estes acontecimentos proporcionam.

De tudo que eu olho e interpreto, e de todas as sensações e pensamentos que me escapam nesse processo, boa parte está impregnada do que eu permito ver, outra parte do que de fato me olha. Eu, dentro ou fora da função professora, também sou encarada como o outro próximo ou o outro impensável. E perceber essa dinâmica não significa codificá-la por inteiro ou definitivamente, mas aceitar que a dúvida e o desenrolar dos acontecimentos, neste caso vivido dentro do espaço escolar, não podem ser traduzidos em uma única via.

A escola que nos afronta é corpo vivo. Seus espaços se tornam reais no cotidiano das ações e dos tempos outros, dos tantos grupos que a preenchem. É desta escola que tratamos, da escola dos pequenos acontecimentos de todo dia.


Imagem de destaque: Rovena Rosa/ Agência Brasil

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