Formação continuada (e à distância) de professores – exclusivo

Dalvit Greiner

Quando iniciei meu curso de Mestrado, em nossa aula inaugural proferida pelo professor Antônio Nóvoa, aqui na Faculdade de Educação/UFMG, abordando o tema da formação de professores, uma de suas observações foi a formação continuada que recebemos pelos livros didáticos que usamos. Não parece óbvio, pois imaginamos as professoras e professores da educação básica com tempo suficiente para preparar suas aulas, o que inclui tempo para abrir-se às novidades pesquisadas pelas universidades.

Como a perfeição platônica reside apenas no mundo das ideias, caiamos no mundo real. Professores e professoras da educação básica formam-se às suas custas num cotidiano estressante sem a tranquilidade necessária para a reflexão, a atualização e a produção de novos conhecimentos para os seus alunos do mundo real. Temos nosso acesso à cultura dificultado. Temos nosso acesso aos livros dificultado. Temos nosso acesso à formação dificultado. Como exemplo, saio de uma turma de mestrado em que metade do grupo atua no ensino fundamental e não teve um dia sequer de licença para uma atividade acadêmica, quiçá a licença necessária para o desenvolvimento de uma pesquisa.

Mas em que medida recebemos uma formação continuada capenga como dizíamos, lá na nossa roça, das coisas imperfeitas ou incompletas? Através do PNLD – Programa Nacional do Livro Didático. O programa vai pré-selecionando livros didáticos a partir de critérios considerados republicanos. Tudo bem, pois são critérios que garantem certa isenção naquilo que se vai oferecer aos nossos meninos. (Como se fosse possível criar um livro isento!) E ali, no Manual do Professor vem a temida formação continuada, embutida no projeto pedagógico do livro ou da coleção. Assim mesmo: limitada ao que foi proposto na obra didática escolhida. Mas, qual professor lê aquilo? Creio que poucos, muito poucos. Mas, ela está ali e ao longo do livro.

Tudo bem, podemos escolher entre várias obras. Mas, “entre várias obras” é um limite imposto à infinidade de possibilidades que outros materiais, outros espaços, outros debates poderiam nos proporcionar. Por exemplo, eu não gostaria de livro didático. Para isso, mais tempo de estudos e maior variedade de materiais. Nunca saímos, coletivamente, daquele estigma apontado por Nóvoa de que professores “não devem saber de mais, nem de menos” (1991). Sempre a medida certa que o Estado quer e proporciona. Quando o fazemos, mesmo após todos os impedimentos oficiais e estatais, o fazemos individualmente. Assim, a limitação de nossa formação continuada continua. As atualizações propostas pelas pesquisas desenvolvidas nos chegam muito tarde, no mínimo com três anos de atraso. Junto com os livros dos meninos.

A diversidade de escolhas é equivalente a escolha de bananas num mercado. Todos são amarelos e longilíneos. Alguns já apodrecidos. O sabor, ou seja, a maneira de abordar o assunto é o mesmo. Os editores encontraram uma fórmula aceita pelos avaliadores e por ela vão caminhando. Vice-versa: parece-me que os avaliadores enchem os olhos com os livros e vão aprovando as mesmas coisas. Uma vez que o assunto é o mesmo, deveríamos ver variedades nas abordagens. Porém, criou-se uma fórmula.

Segundo um dos critérios apontados pelo FNDE – o livro deve “desenvolver no jovem aprendiz a autonomia progressiva nos estudos” – o que não se vê presente nas atividades e exercícios propostos aos estudantes. Os livros ainda carregam a cultura do questionário e do “explique” isso, “explique” aquilo. Não se vê uma progressividade necessária ao aprendizado nas tarefas prevendo a aquisição de competências e habilidades ao longo do capítulo e muito menos propostas de atividades conclusivas da unidade. As tarefas não conduzem o alunado pelo texto favorecendo um aprendizado autônomo e eficiente.

Por fim, os valores investidos no PNLD são bastante altos. Não é uma reclamação, mas uma constatação. É preciso investir ainda mais, nunca menos. A ONG Ação Educativa nos alerta: as empresas de ensino estão levando muito dinheiro da educação pública. E uma das formas de levar esse dinheiro da educação pública é a oferta do livro didático. As empresas de educação aliam-se a editoras e passam a oferecer o material didático valorizando a sua marca educacional. Percebe-se aí que a lógica editorial traz a propaganda e a marca de sucesso do colégio. Isso seduz muito os professores, que consideram a metodologia aprovada pelo público. Porém, qual público?

Na lógica capitalista o ideal é um baixo investimento com alto retorno. Assim também se acumula riqueza na produção do livro. A sua principal matéria prima, porém, não é o papel, mas a criação. Ao diminuir a quantidade de criadores os editores investem radicalmente contra a diversidade padronizando metodologias, temas, procedimentos, arte-final e, por fim, na formação dos professores, oferecida como brinde de altíssimo nível e qualidade, a mesmíssima coisa de norte a sul do país. Um show midiático e em plataformas digitais.

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