Fake News e Eleições de 2022 

Eugênio Magno

O ministro da propaganda nazista, Joseph Goebbels, adotava o lema “uma mentira dita mil vezes torna-se verdade”. E o jornalista, escritor e comentarista político estadunidense, Walter Lippman, dizia que, “sob certas condições, os homens reagem tão poderosamente a ficções, quanto o fazem a realidades, e em muitos casos, eles mesmos ajudam a criar as próprias ficções às quais reagem”.

Muito do que estamos presenciando no Brasil, nos últimos anos mais parece ficção. E neste período de eleições e de campanhas precisamos estar muito atentos para não sermos enredados por narrativas absurdas e fantasiosas que negam os fatos, a ciência, o bom senso e a própria realidade. Se você pensou em factoides, mentiras… acertou. É disso que tratamos neste artigo.

A expressão fake news que quer dizer notícia falsa e chega aos nossos olhos e ouvidos em idioma anglo-saxônico, com ares de novidade, não tem absolutamente nada de novo. A mentira, a notícia falsa, o boato, o mexerico, a fofoca, a intriga, o sensacionalismo, o “showrnalismo”, a espetacularização do fato, a fabricação e a desconstrução de personalidades, a propaganda enganosa, a publicidade travestida de notícia, o informe publicitário e o testemunhal – que confunde o leitor, o ouvinte, o telespectador e o internauta –, são tão velhos quanto a vida humana no planeta. Mas, na atualidade, com o smartphone, essa potência, de bolso, que é telefone, gravador, máquina de escrever, filmadora, relógio, localizador, guia de trânsito, máquina fotográfica, computador e outras coisas mais, é preciso ter em mente que a antiga fofoca de pé de ouvido foi amplificada, caiu na rede, globalizou-se, viralizou e é disseminada, instantaneamente, com apenas um clique. Tudo isso na palma da nossa mão.

Os dispositivos digitais móveis permitem registros factuais, testemunhos e até “provas” críveis para os tempos em que vivemos. O cidadão comum se apropriou da tecnologia e saiu da condição de mero receptor de versões editadas dos fatos, ao bel-prazer da grande mídia, para o contracampo de emissor e replicador de informações, quase sempre sem nenhum preparo para exercer essa condição. A mídia também se utiliza desses registros feitos pelo povo e quando isso ocorre, se apropria indevidamente dessa versão dos fatos; torna-se dona da voz e o resultado é o silenciamento e a invisibilização da voz do dono.

Notícias falsas e verdades difundidas de forma torta não é exclusividade das redes sociais, grassam por toda parte, inclusive na mídia tradicional. Por essas e outras, comunicadores comprometidos com a ética, realizam o ideal do bom jornalismo justamente nos espaços alternativos. Além de possuírem canais próprios também colaboram com a grande mídia, pautando-a ou disponibilizando conteúdos por eles apurados e produzidos.

Longe das censuras ideológicas e econômicas dos veículos de comunicação de massa, respira-se informação democrática nos meios digitais, ainda que a contrapelo da enxurrada de fakes, trotes, piadas, memes, pirataria, mentiras, maledicências e impropérios, tão comuns na web, sem nenhum tipo de controle. Diferentemente do que acontece na mídia tradicional, onde existe excesso de controle: da linha editorial e, fundamentalmente, da hierarquia, dos acionistas do grupo, dos anunciantes, da ideologia, do governo de plantão e de interesses geoeconômicos.

A questão é complexa e o tema das fake news necessita ser enfrentado com a seriedade e a abrangência que exige. As falsas notícias que destroem reputações de pessoas físicas e jurídicas, promovem o trucidamento público de carreiras e marcas, ferem os direitos humanos e sociais, estigmatizam países e marginalizam povos, etnias, raças, gêneros, classes sociais, atores públicos, categorias profissionais e comunidades, devem ser combatidas em todos os espaços de difusão em que ocorram.

A realidade é difusa. Os fatos, os acontecimentos, ocorrem a todo instante. Evoluem, desdobram-se e são repercutidos numa velocidade assombrosa. É extremamente difícil acompanhar todos os desdobramentos de uma ocorrência. Seus efeitos são tão ou mais significativos que os eventos e causas que os geraram e as narrativas midiáticas ou testemunhais reproduzem os fatos a partir do seu ponto de vista, ou da vista de um ponto, ou seja, sempre como versão de um fato. Versão essa contaminada pela cultura, pela ideologia, modos de ver e de dizer, do emissor da vez, seja ele um veículo de comunicação tradicional ou o usuário de um dispositivo de comunicação, nas redes sociais.

Para que a discussão sobre as fake news prospere – em profundidade – e daí surja uma regulamentação que puna essa prática condenável, é necessário mais do que uma canetada (ou uma canelada), o lobby da mídia hegemônica ou a massificação de um pacote pronto e acabado, produzido pela corrente ideológica da mordaça. Uma instância colegiada que venha tratar desse tema deve contar com representantes do mundo político, da grande imprensa, das plataformas digitais e do judiciário. Mas não pode prescindir dos leitores, dos ouvintes, dos telespectadores, dos comunicadores, dos professores, das universidades, de instituições como ABI, FENAJ e OAB, dentre outras, além de internautas, produtores de conteúdo e ativistas das mídias alternativas.

É preciso não confundir liberdade de expressão com desrespeito às leis, ataque às instituições e manipulação de algoritmos. Em tempos de ficções absurdas, eleições e mentiras deslavadas é imperativo que os interesses ambientais, coletivos, humanos e sociais estejam no epicentro da atividade jornalística. Sem mediação, só nos restará a barbárie.


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