Democracia em risco?

Cleide Maria Maciel de Melo

Essa indagação corresponde ao título do livro, recém-editado pela Companhia das Letras (São Paulo, 2019). O subtítulo – 22 ensaios sobre o Brasil hoje – aponta para a autoria coletiva da obra, “intelectuais habituados ao debate público”. A Nota dos Editores, datada de dezembro de 2018, revela o norte do trabalho: uma “interpretação, a quente”, da eleição de “um candidato de extrema esquerda”, à presidência do país.

Quem escreveu os artigos? Não dá para deixar de dizer, a quem convidamos para leitura, os nomes dos que merecem ser lidos! Deixaram seu pensamento/posições no livro, em ordem alfabética: André Singer, Ângela Alonso, Ângela de Castro Gomes, Boris Fausto, Carlos Melo, Celso Rocha de Barros, Christian Ingo Lenz Dunker, Conrado Hübner Mendes, Daniel Aarão Reis, Esther Solano, Gabriela Moriconi, Gustavo Venturini, Heloisa Murgel Starling, João Moreira Salles, José Arthur Giannotti, Matias Spektor, Monica Baumgarten de Bolle, Paula Louzano, Petrônio Domingos, Renan Quinalha, Ronaldo de Almeida, Ronaldo Lemos, Ruy Fausto e Sérgio Abranches (24 autores, pois dois textos foram escritos a quatro mãos). Cada artigo foi organizado em torno de teses/afirmações ou de questões propostas pelos autores. Exceção para o texto de João Moreira Salles, que se utiliza de argumentos da literatura e filosofia para referir-se ao tema proposto pelos editores, articulando-o às noções de força, fragilidade, responsabilidade, atenção, desenraizamento (sua leitura me remeteu à Jane Austen: razão e sensibilidade, na medida da arte!).

Confesso que foi desafiante a leitura de um livro organizado em vinte e dois ensaios. Via de regra, nas obras coletivas, minha atenção é atraída para temas/autores que se articulam aos estudos/pesquisas em curso na minha vida. Ou seja, faço uma seleção. No caso deste livro – tanto porque tenho sentido desejo/necessidade de compreender o que está acontecendo conosco na política hoje, quanto porque me propus fazer esse Convite ao ensejo desta leitura –, o critério já “instalado” na minha experiência, não fazia sentido. Assim é que fui lendo os artigos, na sequência da sua publicação, me empolgando com os argumentos, as informações, os estilos, a ponto de me surpreender perguntando: – o que o próximo vai dizer? Penso que, quem visse de fora, poderia pensar que eu estava lendo uma novela…

Do mesmo modo, constitui também um desafio falar dessa obra! O desejo é comentar sobre tudo que li, sobre o que cada um dos autores trouxe para o debate, os destaques acionados por minha leitura, as metáforas utilizadas, o modo como foi construído cada texto, as posições adotadas frente ao tema, as consultas à internet realizadas num mesmo dia (para grande parte dos textos)… Sim, precisei fazer uma escolha! E a educação ganhou o páreo!

Paula Louzano e Gabriela Moriconi assinam o único texto que tem a educação explicitada no título: Uma guinada equivocada na agenda da educação (p. 247 – 255). Para elas, as propostas/ações do Brasil, nesse campo, vinham sendo articuladas às metas estabelecidas pela ONU e pela OCDE e aos nossos maiores desafios: “aumentar a qualidade e a equidade na educação básica”. O Plano Nacional de Educação/PNE, aprovado em 2014, pelo Congresso, traz as metas para serem cumpridas até 2024, fazendo essa dupla articulação. O governo Bolsonaro “mudou completamente o debate educacional brasileiro” ao deslocá-lo para a questão da doutrinação, considerada “umas das grandes causas dos problemas de aprendizagem dos alunos brasileiros”. O Projeto Escola Sem Partido previa as medidas para resolver o “mal da doutrinação”. Apesar de ter sido arquivado no Congresso, no entanto, tal projeto ainda poderá retornar à pauta. Mesmo que isso não ocorra _ por força da continuidade do movimento de oposição que suscitou _ a herança desse projeto se faz presente nas propostas do Ministério da Educação. Segundo as autoras, a “mudança radical no foco da agenda educacional brasileira dada pelo governo Bolsonaro não só nos afasta do debate internacional, como também atrasa nossa capacidade de atacar os verdadeiros males que assolam a nossa educação e contribuem para perpetuar as desigualdades sociais do país”.

O tema da educação também é referenciado em outros artigos. O Projeto Escola sem Partido, a fiscalização do trabalho dos professores em sala de aula (em todos os níveis, da educação básica ao ensino superior) para que não divulguem a “ideologia marxista”, a interdição dos livros de História do Brasil que apresentam a versão contrária à dos militares, mudança nos currículos para atender ao projeto de uma pedagogia “neutra” indicam, dentre outras medidas, um “retrocesso significativo nessa área nos próximos anos” (como já demonstrado nas posições/iniciativas do primeiro Ministro da Educação). Todas essas medidas estariam integrando o conjunto de ações voltadas para a área dos costumes, tais como o combate à homossexualidade, aos movimentos raciais (negros e índios) e feministas, enfim, recusa de proteção e resgate aos setores situados na periferia da ação governamental.

Vários campos do conhecimento foram acionados pelos autores para refletir sobre a questão proposta pelos editores. À História coube responder, dentre outras, a uma pergunta crucial que revela nosso assombro, frente aos resultados das urnas em 2018: _ Como chegamos aqui?


Imagem de destaque: Companhia das Letras/Divulgação

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