Bruno Pucci: o Mestre chega aos oitenta

Alexandre Fernandez Vaz

Quem no Brasil se interessa por Teoria Crítica da Sociedade em chave educacional terá lido os trabalhos de Bruno Pucci, Pesquisador Emérito do CNPq, Professor Titular da Universidade Federal de São Carlos (UFSCar), aposentado, com atuação em outras instituições brasileiras, em especial na Metodista de Piracicaba. No momento em que ele completa oito décadas de uma vida feliz e interessante – privilégio de poucos neste mundo – é hora de uma vez mais celebrá-lo.

Conheci o Professor em 1993, quando de uma conferência que ele proferiu na Universidade Federal de Santa Catarina, onde eu cursava o mestrado. O cartaz na parede mostrava uma lista de palestrantes que nos visitariam ao longo do segundo semestre do ano e lá figurava alguém que eu não conhecia e que falaria sobre Teoria Crítica e Educação. Eu tinha grande interesse no tema, com minhas leituras esparsas e abordagens errantes, ainda tentando delimitar com mais clareza o que escreveria como dissertação. Sentei-me ao fundo do auditório do Centro de Ciências da Educação e prestei atenção à exposição sem firulas, sem truques para entreter a plateia, calma, objetiva, interessante, repleta de questões que representavam o momento do grupo que ia se constituindo no interior paulista sob sua liderança: os inícios de uma leitura sistemática dos frankfurtianos, em especial de Theodor W. Adorno, à procura de uma reflexão original sobre a educação. O intuito, segundo entendo, não era simplesmente encontrar um lugar a mais na feira acadêmica, mas buscar modelos críticos que permitissem pensar sobre a educação para além dos esquemas em que ela fora encaixada por certo marxismo que já não trazia o melhor dessa tradição – a crítica –, legando-a a uma espécie de cosmologia teleológica.

Quase sete anos depois eu o reencontrei, desta vez em Piracicaba, para o Congresso que ele e um grupo de professores e pós-graduandos organizavam. Fui muito bem acolhido e, em sinal de confiança, solicitou-me que coordenasse uma sessão de comunicações. Foi lá que apresentei uma parte importante do que seria minha tese de doutorado, defendida dois anos depois na Leibniz Universität Hannover, Alemanha. Desde então frequentei o evento bianual e várias outras atividades organizadas ou propostas por Bruno, além de ler tudo o que pude de sua lavra. Incluiu-me em projetos e coletâneas, convidou-me para bancas e conferências, apoiou-me sempre sem reservas, o que é ainda hoje importante, e foi fundamental nos primeiros anos de carreira.

Entre tantas atividades com Bruno, das que mais me deram prazer foram as bancas de mestrado e doutorado, atividade pela qual, em geral, não tenho grande apreço, mas que ganharam sempre um sentido mais elevado quando estivemos juntos. Aprendi muito escutando-o em arguições cuidadosas e precisas. Vem-me de imediato à lembrança a defesa de tese de Christian Muleka Mwewa, meu orientando, hoje professor efetivo da Universidade Federal do Mato Grosso do Sul, em 2010. O ousado trabalho, intitulado Adorno, Hall e Canclini: a formação na constelação das mediações culturais, ele soube ler, avaliar e potencializar como ninguém mais. Ambos pulicariam juntos, no ano seguinte, o artigo Conversa desarmada: teoria, crítica e literatura.

Por meio de Bruno conheci pesquisadores importantes que se tornaram amigos queridos, como Antônio Álvaro Soares Zuin (UFSCar), Luiz Antônio Calmon Nabuco Lastória (UNESP de Araraquara) e Luiz Roberto Gomes (UFSCar), com quem compartilhei ótimos momentos de trabalho, além de Andreas Gruschka, Professor da Universidade de Frankfurt, com cuja obra eu tivera contato durante os anos de doutorado. Em 2004 conheci-o em Piracicaba, ele faria a conferência de abertura do evento e fui escalado para fazer-lhe a tradução consecutiva. Foi uma experiência difícil, desgastante (foram três horas de atividade), mas muito gratificante. Dois anos depois repeti a dose e traduzi também parte do curso que Andreas ministrou na mesma cidade, no pós-evento, assim como em Florianópolis dias depois. Encontramo-nos muitas vezes, verti ao Português trabalhos seus, ele recebeu Bruno de Almeida Faria, doutorando por mim orientado, para um estágio sanduíche, participamos juntos em muitas atividades de pesquisa. Não fosse a confiança que Bruno me depositara lá atrás, possivelmente nada disso teria acontecido.

Nos últimos tempos Bruno tem se dedicado a estudos de Estética, com grandes contribuições para nós, seus leitores. A literatura brasileira está em primeiro plano,a ela se dedica com sensibilidade e força conceitual. Como escrevi em outro lugar, suponho que, ainda mais que antes, neste caminho ele exerça a crítica social, ou seja, faz Teoria Crítica, o que é muito mais complexo e importante do que falar sobre a tradição frankfurtiana.

Seminarista e sacerdote, candidato a prefeito de Rio Claro pelo Partido dos Trabalhadores nas suas origens, em 1982, professor, orientador, pesquisador, organizador de obras e eventos, leitor atento e generoso;amizades, filhos, amores: muitas vidas bem vividas, enquanto a maioria de nós tenta viver pelo menos uma que valha a pena. Bruno combate o bom combate. Admirável.

Ilha de Santa Catarina, setembro de 2020.


Imagem de destaque: Josianne Francia Cerasoli

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