Brumas Pedagógicas – parte II

– camaleões nasalizam consoantes linguodentais –

 

Ivane Laurete Perotti

 

Articulações à parte, Muthos arremessa vorazmente a sua língua. Como de costume, sem dar ponto aos modos, declina a si mesmo em versões narrativescas. Conta, o dito, com a parceria da crença: requintada forma de se fazer ser. Conta, pelo bem da verdade, com um certo tipo de crença: fenômeno decantado pelas ciências sociais na tênue fronteira entre o verdadeiro e o ficcional. Muthos ignora as ciências. Seu lugar advém da denegação: representações e recalques batalham no mesmo front. Ainda que diante dos embriões da etnologia, Muthos nega oferecer modelos para o comportamento: sua linha, sua tinha! No processo, o contágio de significados e valores toma os incautos.

_ Pode repetir isso daí, professora?

_ Sim! Conforme Eliade (1986, p.10) “(…) ele fornece modelos para o comportamento e, por isso mesmo, confere significado e valor para o comportamento humano.”

_ Não foi isso o que a senhora disse.

_ Faço uma leitura da leitura do autor… conversando significados, discutindo…

_ Olha só! Não estou aqui para estudar vaguezas. Quero saber da prática, entendeu? Da prática!

_ Estamos construindo exatamente esse caminho. Vamos chegar em Lévi-Strauss e…

_ A senhora pode repetir?

_ Outra vez?

_ Sim! Pode? Estou pedindo com respeito. Pode?

_ Posso! Esta aula tem por objetivo a discussão sobre a “…a história que aí está contada.”, uma referência a Strauss (1975, p.232) e…

_ Não desvia, professora!

_ Com certeza, a direção está…

_ Pois saiba que eu não lhe pago para inventar histórias. Estou aqui para aprender.

_ Estamos no processo de construção do conhecim…

_ A senhora não tem coragem de repetir, né!? Pois eu gravei! Gravei tudo! E vou postar em todas as redes sociais!

Camaleões projetam-se na onda de sibilações fototônicas. A crença, amanhecida, resmunga advertências: o verbo cria! Muthus replica: fiat lux! Toma lá, dá cá!

No universo de Muthos a família Chamaeleonidae recebe um “pacote de relações” (STRAUSS,1975, p.234). Falar não é simples. Dizer é complicado. O fonema não vai sozinho: às linguodentais /t/ e /d/ não basta a fome de nasalizações. Mas camaleões desconhecem fonética, fonologia, filosofia, sociologia… coisas típicas das humanas veleidades.

_ Professora, isso é uma metáfora?

_ Não! Isso é biologia!

_ Existem camaleões no Brasil?

_ Ah! Isso é uma metáfora! Melhor deixar para a sociologia.

_ Não seria… biologia?

_ Na verdade, isso também é ficção. Não é?

_ A biologia?

_ Não… a metáfora! Ah! Paul Ricoeur! Quem dera aprender contigo a “dedução transcendental dos símbolos” …quem dera!

_ Isso é Filosofia?

_ Gramática!


REFERÊNCIAS

ELIADE, Mircea. Aspectos do Mito. Lisboa: Edições 70, 1986.

LÉVI-STRAUSS, Claude. Antropologia Estrutural. Tradução de Chaim Samuel Katz e Eginardo Pires. Rio de Janeiro: Editora Tempo Brasileiro, 1975.

RICOEUR, Paul. A metáfora Viva. Tradução de Dion Davi Macedo. São Paulo: Edições Loyola, 2000.

Imagem de destaque: Christa Dodoo / Unsplash

https://zp-pdl.com/get-a-next-business-day-payday-loan.php https://zp-pdl.com/emergency-payday-loans.php http://www.otc-certified-store.com/neurological-disorders-medicine-europe.html

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *