As reformas da Educação e Autonomia Docente

Desde as primeiras décadas do século XIX, quando pela primeira vez se aventou a possibilidade de expansão da escola pública no país, foi-se produzindo o diagnóstico de que uma das dificuldades para se fazer isso era a falta de professores bem formados. Foi no bojo dessas primeiras discussões que, a partir de 1835, foram criadas as primeiras Escolas Normais no Brasil com o intuito de formar, quer dizer, de  normalizar os professores.

De lá para cá, como se tem dito aqui nesse espaço há um bom tempo, um conjunto muito expressivo de reformas foram propostas com o intuito de melhorar a educação, muitas das quais foram abandonadas no meio do caminho, interrompidas ou jamais realizadas. Em todas elas, o mesmo diagnóstico resumido por Rui Barbosa, ainda no século XIX: “reforma do método e reforma do mestre”, eis a mais completa reforma da educação pública que se pode ter!

É evidente, sabemos hoje, que, a considerar os discursos, nenhuma das reformas parece ter dado o resultado esperado. Embora seja inegável que a escola pública, a mais republicana e capilar de nossas instituições públicas, tenha inúmeras qualidades o discursos se atualiza cotidianamente: a escola pública é de péssima qualidade e isso se deve, fundamentalmente, à falta de formação do seu professorado!

Mas, desse diagnóstico resultaram ações profundamente perturbadoras para os professores: o seu controle e, logo, a perda de sua autonomia. E, mais, se não bastasse isso, a corrosão de sua auto-estima e da própria autoridade docente em sala de aula.

Não é sem sentido que, ao mesmo tempo em que o Estado instituiu as Escolas Normais, instituiu também um amplo sistema de inspeção da ação docente, que buscava mobilizar deste a vizinha da escola até as mais altas autoridades provinciais ou estaduais no controle do trabalho do professor.  Controlar os professores em sua moralidade e saberes era pedra de toque das políticas educacionais imperiais e, depois, republicanas.

Destituído do lugar de saber, por não saberem, os professores foram, paulatinamente, destituídos também de sua autonomia. Se os saberes que valem são os “saberes dos outros”, aqueles das Escolas Normais e/ou dos especialistas (homens em sua maior parte), como atuar com certo conforto na sala de aula?

O investimento atual em regrar, e criar bases ou parâmetros para ação docente, sem que estes elementos guardem uma intensa e expressiva relação com a comunidade escolar e com a experiência docente na escola básica pública, nada mais é do que a atualização dos discursos e das práticas contra os professores, seus saberes e sua autonomia. Melhor fariam as autoridades das repúblicas e seus reputados especialistas se buscassem perguntar e entender como e porque professores considerados tão “mal formados” mantêm secularmente uma escola pública cuja qualidade continuamente vai de encontro à nossa vergonhosa desigualdade sócio-econômica e às práticas predatórias, racistas, sexistas, homofóbicas… de nossas elites.

Aí, nesse momento, talvez nossas autoridades republicanas e seus especialistas poderiam ouvir e aprender com os nossos professores o que é necessário para fazer uma escola pública de qualidade. Certamente que não é, nunca foi, investindo tão somente na formação e no controle dos professores!!!! Mas querem as nossas autoridades e especialistas que as acompanham no assalto que tramaram contra a República, saber disso? Parece-nos que não.

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