Adolescentes na EJA: negação ou atendimento de direitos?

Adelson França Júnior1

A regulamentação vigente para o corte etário de ingresso na Educação de Jovens e Adultos, a saber 15 anos no Ensino Fundamental e 18 anos no Ensino Médio, foi efetivada em 2010, a partir da Resolução CNE/CEB nº 3, de 15 de junho. Ressalto aqui que as polêmicas estiveram bastante presentes na época do debate no Conselho Nacional de Educação. A principal, talvez, foi a discussão de que a possibilidade da presença de sujeitos de 15 anos de idade incentivaria o aumento do fluxo de encaminhamento dos/as adolescentes repetentes, indisciplinados e com histórico de abandono escolar temporário do Ensino Fundamental para a EJA.

Fato é que, passados 10 anos de regulamentação da idade mínima para matrícula na EJA, vislumbramos, em muitos casos, o cumprimento da profecia alardeada. Muitas redes municipais e estaduais e suas escolas de fato propõem a estes(as) adolescentes a EJA como um presente-punição, que não se pode recusar, no momento em que se tornam debutantes.

Vale lembrar que a presença de adolescentes na EJA não é um fenômeno recente, como muitas vezes pode parecer. O que há de novo nessa presença além, é claro, do número expressivo das matrículas deles(as) – hoje, na faixa etária de 15 a 17, ocupam um quarto do Ensino Fundamental – são as causas dessa permanência. Enquanto os/as adolescentes do passado buscavam a EJA para a escolarização negada por terem sido excluídos da escola – quase sempre em função das incompatibilidades perversas com o trabalho no mundo capitalista – os/as adolescentes do presente estão na EJA após terem sido excluídos na escola, tendo seus direitos negados por outros formatos que ultrapassam o comparecimento rotineiro às salas de aula.

Os dados da última década apontam a constância desse processo excludente conforme a tabela a seguir:

Nessa linha, fica explícito o movimento de negação do direito à Educação dessas crianças, que se tornam adolescentes da EJA. O acesso não garante o direito. É preciso ir além e efetivar políticas educacionais e práticas pedagógicas que repensem o acolhimento, as condições de permanência e a garantia da construção de conhecimento na escola. Para isso é fundamental problematizar as causas para este fenômeno que a princípio apontam para as inadequações das ofertas educativas que não envolvem todos(as) e cada um(a) e também para as demandas de elevação, a qualquer custo, do Índice de Desenvolvimento da Educação Básica (IDEB), que (in)conscientemente mobiliza gestores a promoverem ações de cunho pedagógico higienista e expulsarem sujeitos “não-adequados” aos exames e de fluxos “errados” que necessitam de correção.

Por outro lado, apesar da origem do processo de chegada destes(as) adolescentes à EJA se constituir pela negação de seus direitos, a estadia deles(as) na EJA é garantia de seus direitos. Nesse sentido, a história de vida deles(as) se alinha com a história de vida de todos os outros sujeitos da EJA. A origem é a negação de direitos que, reconhecida e combatida, transforma-se em resistência, reexistência e luta pelo atendimento ao direito. Assim, em coro com Analise da Silva quando descreve sobre as características dos jovens na EJA e o esforço que deve ser empreendido para a aproximação da escola das condições juvenis, corroboramos que cada um dos números apresentados na tabela anterior representa “jovens pertencentes a uma classe social, a uma raça, a um gênero, com religiosidades, com histórias, com trajetórias e vivenciando situações que os fazem diferentes de todos os outros e entre si”. (DA SILVA: 2020, p.161)

Estes/as adolescentes, frutos das desigualdades sociais que insistimos em manter, são DA EJA e não apenas estão NA EJA. São sujeitos de direito, que denunciam em suas trajetórias educacionais as mesmas injustiças, embora infligidas de forma diferente, dos jovens, adultos e idosos, centralidade dessa modalidade ainda tão necessária. Não dá para novamente negar direitos a eles(as). É preciso o “entendimento do jovem educando da EJA como o ‘cara certo que está no lugar certo’ (…) e a compreensão de sermos nós, os professores e as professoras de jovens educandos da EJA, também ‘os caras certos no lugar certo.’” (DA SILVA: 2020, p. 163)

Cabe a nós, portanto, denunciar veementemente as causas da permanente negação de direitos e construir, paralelamente, alternativas que respeitem as especificidades dos sujeitos para o atendimento dos direitos. Afinal de contas, essa é a essência da Educação de Jovens e Adultos. Reconhecer, combater e positivar a negação!

 

1Educador da EJA na PBH e professor na UEMG-Ibirité. Pedagogo e Mestre em Educação.

 

Para saber mais:
DA SILVA, Analise. Na EJA tem J: Juventudes na Educação de Jovens e Adultos. Curitiba: Appris Editora, 2020.

 


Imagem de destaque: imagem cedida pelo autor.


Imagem de destaque: Free-Photos 900/Pixbay 

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