A violência no contexto escolar e o corpo que fala – exclusivo

Tiago Tristão Artero

Para entendermos a violência no ambiente escolar, é preciso observarmos o ser humano em determinada perspectiva.

Há, impregnado nos movimentos, nas atitudes humanas corporais, a cultura de determinada nação, dos indivíduos. A linguagem do corpo baseia-se no desenvolvimento filogenético e ontogenético e é facilmente observada na natureza. A razão, a emoção, a carga de linguagem presente nos gestos e movimentos, ali está o ser social: nos movimentos.

Onde pode estar a violência? Na negação do corpo, na indiferença em torno da necessidade de comunicar-se pela palavra, pelo movimento, pelos gestos. Repentinamente, a violência ocorre… na explosão de sentimentos e na necessidade de mover, aprender, interagir. Tanto nas crianças, quanto nos adolescentes. Eis que vemos a violência como processo de mediação das relações.

Werneck (1997) diz que a ênfase biológica e a dicotomia que fragmentam a totalidade humana ampliam as possibilidades de manobras sobre o corpo pelo jogo de poder. Então, mostra-se urgente, pensar esta escola atual, com os alunos sentados e enfileirados, fragmentados na dualidade mente e corpo, imobilizados e privados de realizarem plenamente as interações sociais necessárias ao desenvolvimento individual e coletivo.

Quando a escola nega o ser humano em sua totalidade, subjugando sua linguagem, seus movimentos, sua cultura presente nas manifestações sociais a partir de seu corpo e sua gestualidade, está deixando de cumprir o que podemos apontar como fundamental: valorizar o ser humano proporcionando suas interações sociais e, consequentemente, a aquisição dos conhecimentos construídos geração após geração.

Como diz Angelo Vargas, no artigo “Movimento e gestualidade”, entender civilizações não pode acontecer sem abordar a palavra dentro da gestualidade e a gestualidade dentro da palavra.

Quanto conhecimento há no exposto acima, já que a condição psicossomática é, indissociavelmente, elemento a ser considerado no processo de aprendizagem e de ensino.

Imaginando as representações sociais que os adolescentes constroem sobre o ambiente escolar, podemos analisar algumas relações entre os sujeitos da aprendizagem.

A importância do convívio social, valorizado por Vigotski, nos permite observar as mediações existentes na escola, instituição esta, presente diariamente na vida de tantas crianças e jovens. Essas mediações estão ocorrendo considerando os indivíduos dotados de cultura, indissociáveis de seu corpo que fala, que revela, que produz e que é parte essencial da aprendizagem?

Pouco vale a escola ter uma sala de cinema, projetor em todas as salas, computador disponível como parte dos materiais, se não considerar o ser humano presente em sua totalidade, possuidor de uma capacidade de abstração, mas que necessita de algo significativo. Isso ocorre quando é trabalhado em toda sua estrutura biopsicossocial.

Sanções, regras, proibições, convenções sociais, entre tantos outros métodos de controle utilizados nas instituições de ensino regular, são aplicados no corpo dos alunos. Assim, as sociedades humanas agem, mas coerentemente poderiam agir valorizando as potencialidades ali presentes.

As múltiplas manifestações dos símbolos presentes no ensino escolar, suas mediações, linguagem, gestos e palavras dizem muito sobre que tipo de ser social estamos formando, qual coletividade estará representada e em que termos nossos alunos agirão sobre a natureza deles mesmos e na sociedade em que vivem.

Quando Saviani cita Ivan Illich e tece as considerações a respeito inutilidade da escola, ou ainda, da nocividade da escola, nos atentamos em refletir sobre esse ambiente e sobre as concepções de ser humano existentes neste meio.

Perceber o contexto escolar como social e cultural, fornecedor de recursos que darão subsídios para entender as relações e representações estabelecidas, principalmente no que tange à indisciplina e à violência, possibilitará buscarmos novas interações e, até mesmo, novas perspectivas educacionais.

Por isso, notar as manifestações de violência dos jovens no ambiente escolar pode dizer muito sobre as relações assumidas entre eles, com a equipe docente e com toda a comunidade escolar.

Vamos todos pensar duas vezes antes de colocarmos nossos alunos para “aprender” sentados, horas e horas. Afinal, quem disse que para aprender matemática, português, história, geografia e tantas outras disciplinas, devemos ficar sentados escutando alguém falar?

Reprimindo as possibilidades de uso do corpo, contribuímos para uma geração sem autocontrole, autoconfiança, limitados em sua capacidade de autorregulação… criadores de possibilidades não esperadas pela comunidade escolar. Possibilidades violentas!

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