A universidade e seus currículos: por uma leitura humanista II

Roberto Rafael Dias da Silva

Há alguns meses fui convidado para proferir uma palestra em uma Escola Politécnica de uma universidade situada no sul do Brasil. A atividade acadêmica era bastante provocativa e aproveitando a oportunidade resolvi estruturar meus argumentos em torno da seguinte interrogação: Por que precisamos das Humanidades em cursos de formação técnica e tecnológica? A problematização produzida foi muito bem recebida pelos estudantes e, neste texto, resolvi avançar em minhas reflexões sobre as universidades contemporâneas e seus currículos valendo-me daquela experiência de diálogo com futuros engenheiros, arquitetos, cientistas da computação, designers, dentre outros.  Para reiterar minha opção por uma leitura humanista, resolvi começar por uma breve aproximação à história da ciência, mais especificamente da Geometria Projetiva.

A Geometria Projetiva atualmente nos apresenta inúmeras possibilidades de trabalho nas engenharias, na arquitetura, na ciência da computação e no design. Mas, sem dúvida, esta ferramenta matemática tem uma origem relativamente controversa que nos interessa para pensar nossos fazeres científicos e tecnológicos no contemporâneo. Uma definição muito conhecida da Geometria projetiva vincula-se ao “estudo das propriedades descritivas das figuras geométricas”, que foi desenvolvida por Jean-Victor Poncelet na obra “Tratado das propriedades projetivas das figuras”, publicada no ano de 1822. Ampliando os limites da Geometria, os estudos de Poncelet nos permitiram descobrir, analisar e utilizar mais regularmente as propriedades que as figuras possuem.

Todavia, em uma pequena incursão pela História da Matemática, vamos perceber que sua origem é um pouco mais antiga. Já no final do século XV, a partir de algumas dificuldades encontradas pelos pintores renascentistas que pretendiam dar uma imagem mais natural para suas pinturas, estes buscavam desenhar tal como estivessem imitando a própria perspectiva da visão humana. No Renascimento, então, questões de ciência, tecnologia, geometria e arte entrelaçaram-se fortemente, contribuindo para estruturar as bases daquilo que nomeamos como ciência moderna.

Meu interesse em buscar a história da Geometria Projetiva neste momento trata-se de um recurso argumentativo para interrogar e, ao mesmo tempo, defender a necessidade do diálogo entre as Humanidades e as questões tecnocientíficas. A defesa das Humanidades acontece justamente no momento em que seu lugar nos currículos acadêmicos é questionado em todo o mundo, em nome de uma lógica instrumental na composição do processo de formação humana. Olhando para as breves digressões históricas que realizamos nesta reflexão, poderíamos interrogar: Seria desejável que os engenheiros conhecessem a Filosofia? Seria interessante que os matemáticos estudassem Música?  Seria desejável que os cientistas da computação fossem amantes da Literatura?  Seria interessante que os arquitetos buscassem conhecer mais de Sociologia?

Por que precisamos das Humanidades em cursos de formação técnica e tecnológica? Tomando a história da Geometria Projetiva como um exemplar analítico, proponho que os currículos das universidades possam revitalizar o potencial formativo das Humanidades. Junto à filósofa Marta Nussbaum, considero que, em nome da profissionalização acelerada, as instituições de ensino superior não podem abdicar do “cultivo da humanidade”. Fazendo uso da expressão cunhada por Cícero, Nussbaum provoca-nos a pensar a formação humana a partir da busca de um exame crítico de si mesmo, da construção dos laços de reconhecimento e da capacidade de imaginação narrativa.


Imagem de Destaque: Iñaki del Olmo

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