O neoliberalismo, que sofreu sérios abalos com a crise de 2008 e com a atual pandemia, está tentando desesperadamente se manter como a atual superestrutura ideológica do capitalismo. De acordo com a história, ele se originou logo após o término da segunda guerra mundial na forma de uma discordância pertinente às ações intervencionistas do Estado. Tal discordância teve como alvo as propostas políticas da social-democracia inglesa bem como a instauração do Estado de Bem-Estar em países europeus.
Defensores das teses neoliberais consideravam que os programas sociais democráticos constituíam uma séria ameaça à liberdade econômica, porquanto o capitalismo da época caminhava a todo vapor, indicando a concretização de uma longa fase de auge nunca anteriormente conseguida.
A década de setenta do século passado foi marcada por uma longa e profunda recessão e, com o predomínio de taxas baixas de crescimento ao lado de taxas altas de inflação, estimulou a difusão de ideias neoliberais. No final desta década, surgiu a oportunidade de instauração de programas governamentais de cunho neoliberal nos governos de Thatcher e Reagan. Em nosso país, o início ocorreu em fins do século passado e avançou irregularmente até o momento atual.
Os adeptos do neoliberalismo defendem três ideias principais: cortes significativos nos tributos, controle rígido do déficit orçamentário e a implementação acelerada do processo de privatização das empresas estatais. Segundo eles, um mercado livre é condição essencial para a manutenção da competitividade, a qual torna máxima a eficiência econômica, bem como contribui sobremaneira para que a liberdade individual e a solidariedade social sejam devidamente preservadas. Tal solidariedade é decorrência da coordenação natural e não intencional de diversas pessoas que agem de acordo com seus próprios interesses e aspirações.
Eles atribuem ao governo as tarefas de zelar para que os instrumentos reguladores da produção de bens e serviços funcionem a contento e de facilitar o processo mercantil de todas as coisas. Assim sendo, o Estado tem que ser mínimo, porém robusto, capaz de fazer com que as leis que norteiam a competição sejam cumpridas. Deve ser eficaz também na manutenção da ordem interna e na proteção contra os inimigos externos.
Por considerarem que as atividades estatais são improdutivas, ineficientes e antieconômicas, os seguidores da cartilha neoliberal almejam eliminar do imaginário social a concepção do Estado provedor, particularmente a ideia de educação pública, universal e gratuita que se encontra internalizada no subjetivismo das pessoas como um direito democrático. Pretendem, então, criar e legitimar um outro consenso assentado nos valores empresariais, ou seja, na mensurabilidade, na competitividade e no lucro.
De acordo com os parâmetros neoliberais, a educação tem que ser vista como um produto oferecido ao mercado, porquanto os mesmos apontam que ela, desde há muito tempo, vem sendo gerenciada de modo inoperante. Só por meio do uso de procedimentos administrativos próprios das empresas privadas será possível torná-la mais eficiente e mais democrática.
Enquanto mercadoria, a educação deve ser comprada e vendida no mercado. Isto supõe, portanto, uma forma de exercício do direito de propriedade, observando que toda operação de compra e venda se assenta no princípio da desigualdade, o qual os neoliberais atribuem a propriedade de estimular a melhora individual, o esforço e a competição, virtudes sustentadoras do mérito pessoal. Assim sendo, a mesma é alcançável apenas por alguns que fazem dela o que bem entenderem.
Trata-se de uma educação de qualidade máxima, voltada para o mercado de trabalho, isto é, para a aquisição de conhecimentos, habilidades e atitudes relacionadas ao exercício profissional onde o empreendedorismo aparece de maneira destacada. Acrescente-se ainda que os neoliberais almejam tornar a escola um mercado para os produtos relacionados à informática e à indústria cultural.
Infere-se, portanto, que os neoliberais almejam incutir na mente das pessoas uma representação de vida em sociedade onde inexistem cidadãos. Em seus lugares encontram-se consumidores em situação de disputa. A educação escolar é vista por eles então como um fator estratégico para a elaboração dessa imagem, um instrumento relevante dessa vigorosa proposta de reforma cultural caracteristicamente regressiva, antidemocrática e francamente favorável à despolitização.
Parece claro que o alastramento do neoliberalismo, cujos seguidores só conseguem suportar a democracia representativa, não foi capaz de extinguir o valor dos direitos individuais e coletivos, a importância da participação conjunta e direta em questões relacionadas à vida de um país e à condução política do Estado. Apesar destas ocorrências, seus partidários continuam não demonstrando nenhuma preocupação e nenhum interesse em relação à educação para a cidadania.
O que realmente desejam, sem titubeio algum, é que os processos formativos se voltem apenas para o mercado de trabalho. Para eles, o que interessa de fato é a ostensiva manutenção do indivíduo como cidadão passivo e sua atuação única e exclusiva no âmbito da esfera privada.
Imagem de destaque: Marcelo Camargo/Agência Brasil