_ Vai que pega, né?
_ Está de sacanagem outra vez, Alípio?
_ Não, mano! Tô sacando as forma atual de sedução, tendeu?
Do tema acontecimento, “pandemia”, para aquele que o atravessa, vai uma máscara e meia…
_ Meia máscara!
No desacordo reinam plagas. Territórios a conquistar. O que levou os discursantes a repassarem o fato. Posto em evidência o deleite narrativo, a tal da realidade criada envergou o quadro.
_ Eu estou dizendo! Agora, o jeito como você tira a máscara do rosto revela a sua vida sexual.
_ Cara! Você viaja demais! Qual é!?
_ Estou dizendo! Tenho observado o povo. Fico de olho ni’um, ni’ôtro… e vai assim: quem tá de vontade, tira devagarzinho. Sem pressa. Muito lentinho. Tendeu? E… e …se tivé de barriga cheia, bota os olhinho prá cima e deixa a máscara no meio do caminho.
_ Você não pode dizer essas coisas, meu!
_ Posso! Tanto posso que tô lhe dizendo!
_ As pessoas estão cansadas das máscaras, e…
_ Tamo todos! Mas a coisa do …com máscara, sem máscara, aumentou os lucro dos motel!
_ Nunca ouvi tantas besteiras. Você precisa de tratamento!
_ Nananinanão…você qui tá muito desfocado! Observa! Observa! Qué vê? Quando você encontra um sujeito desmascarado na rua…pode sabe! É das direita!
_ De quem?
_ Do…do povo lá que mandô tomá remédio pros verme.
_…
_ Da gripezinha, meu! Aqueles lá!
_ Ah! Tá…até concordo, mas…
_ Mas, nada! O cara consciente se cuidô e cuidô dos ôtro.
_ É! Tem razão!
_ Então, presta atenção! O cabra com a máscara no queixo, tá dando mole. O ca máscara nas orelha, não qué sabe! O cara que…
_ Você se tornou analista de comportamento? Ah! Não dá prá prova isso daí, meu!
_ Mas eu não quero prová, tô explicando a minha teoria.
_ Vai…
_ Assim, dois ano de pandemia, de máscara nas fuça, ela se tornou um objeto de …
_ Necessidade!
_ Também! Mas quero dizer que usar máscara é quase…quase como usar roupas íntimas! Saca?
_ Exagerou, Alípio. São dois polos diferentes!
_ Por isso mesmo se complementam! A gente não vê mais as fuça do povo! E enquanto isso, tá cheio de vê …vê…natiches !
_ Ficaria melhor em francês…
_ De qualquer jeito, os…os assento estão à vista.
_ Sem máscaras. Tô pensando aqui!
_ Então, o…o… traseiro exposto, as fuça coberta…
_ Você pensa que é um tipo de compensação?
_ Quase isso! Uma lei do mercado, cara!
_ Fala isso não! Fala não! Olha o show que o Ribeirinho deu!
_ Tá aí! Os cara brigô pra não usá máscara e deu na mesma.
_ Me perdi.
_ Os cara de pau fizeram tudo nas tora, mano! Nas fuça! Sem máscara! E o povo só vê…
_ Não vê!
_ Então, a máscara na cara está como…como posso dizer? Tá…tá alimentando os fetiche!
_ Longe demais! Volta um pouco!
_ Tipo o namoro antigamente, tendeu? Vai mostrando …mostrando…prum lado, pro ôtro…sobe, faz que tira…
_ Isso é libidinoso demais, Ali! Parece o preâmbulo de um strip–tease barato!
_ É isso…um strip! Essa é a palavra! Obrigado, amigão!
Com o curso da pandemia, não apenas as palavras se instalaram acontecimentos. As pessoas também. Invernadas, sem trato, salvaram o casco e afundaram a tripulação. Especialmente a que comanda a saúde mental. Ou a que reconhece fatos e destratos. E aquela que dá conta de nominar o inominável.
Não que Alípio estivesse completamente errado. A face mudara sua geometria. Acobertada por uma camada de pano, do nariz para baixo, supervalorizara as orelhas. Excelentes cabides! Os olhos, ah! Os olhos! Francos atiradores não passaram da porta. Olhou demais, levou! Olhou direto, foi questionado. Segurou a olhada por tempo ilimitado, ficou sozinho. Isso de perscrutar a janela da alma configurou violência. Visual. Emocional. De caráter.
Abraços e mãos recolheram-se ao ostracismo obrigatório. Necessário. Juntar os corpos em encontros sociais um rosário de lamentos. Impedimentos. Mas a coisa toda não ficou por aí. As máscaras, como em A máscara da morte rubra, de Allan Poe (1842), evidenciaram os jogos políticos. Os menestréis do rei. O rei louco. A peste. Os porões da ignorância. E as mortes…um contínuo de dores e perdas. Faltou o derradeiro momento da cobrança justa. Justiça. Mas deve chegar. Sem máscaras. Para dar a “cara a tapa” e retomar o rumo da nau.
Talvez Alípio tenha esquecido de comentar que a dança das máscaras é um verdadeiro quebra-pernas. E em navios que afundam, os primeiros a fugir são os ratos. Dessa trama, quem entende é Dyonélio Machado (1935), uma trama nada trivial.
_ Ô Alípio…por que você começou com Lá da casa da sogra…?
_ Cara! Foi lá que a coisa degringolou. Isso de família botando a mão no que é dos outros…
_ Mas, tá meio sem nexo essa sua justificativa!
_ Nada! Eu estava usando a máscara nos olhos.
Imagem de destaque: Galeria de Imagens