Cenários em transformação: promoção da saúde sexual e mobilização social

Daniela Barsotti Santos

O cenário dinâmico da pandemia da COVID-19 nos convida à reaproximação das práticas de ensino presenciais em diálogo com as tecnologias de informação e de comunicação. No processo de aprendizagem universitária, faz-se necessário tomar uma perspectiva histórica da produção do conhecimento, assim como de fazer pontes com os contextos sociais onde a vida acontece.

A pesquisa “Cenas e cenários sexuais de mulheres na pandemia da COVID-19: contribuições para ações de promoção da saúde e políticas públicas de saúde”, desenvolvida na Universidade Federal do Rio Grande (FURG), busca subsidiar ações de comunicação e educação em saúde que ampliem a participação popular nas esferas de debate sobre políticas públicas de saúde. A pesquisa se articula com a formação universitária e as ações comunitárias pela proposição de um grupo de estudos com graduandos, a interação em redes sociais da internet e a formação de um grupo reflexivo de mulheres. Nesse sentido, propõe-se, com a pesquisa, promover reflexões em contextos educativos diversos.

A doença ocasionada pelo novo coronavírus passa a ser entendida como sindemia, caracterizada no entrecruzamento com outras pandemias como a de HIV/aids e seus efeitos sociais e econômicos. Os monitoramentos epidemiológicos e as análises de políticas públicas apontaram taxas de casos novos e de mortalidade que variaram em intensidade nas diferentes populações e grupos sociais. Compreende-se que tais indicadores não são apenas o resultado da propagação do vírus e da capacidade de imunização das pessoas, mas também das determinações sociais, dos hábitos de vida das pessoas e da (não) adequação e (in)coerência das respostas sanitárias dos governos. Para além dos efeitos estritamente fisiopatológicos do vírus, as medidas de saúde tomadas ao longo do período tiveram efeitos, por vezes, deletérios sobre os modos de se relacionar e vivenciar a sexualidade (GIAMI, 2021).

Em países como o Brasil, a pandemia da COVID-19 desvelou desigualdades sociais abissais que atingem especialmente grupos sociais já vulnerabilizados, como mulheres, trabalhadores(as) informais, pessoas idosas, e moradores(as) de regiões periféricas e pobres (NASCIMENTO et al., 2021). Pesquisas sobre a COVID-19 e o sexual refletem preocupações com relação aos direitos humanos e, em particular, os direitos sexuais (GIAMI, 2021).

As mulheres podem ser especialmente afetadas quando se considera diferentes marcadores sociais que incluem orientações sexuais e identidades de gênero que expõem as pessoas a maior risco e vulnerabilidade em tempos de crise.  A exemplo disso, o cenário pandêmico foi analisado com apreensão entre pesquisadores e representantes de movimentos sociais de pessoas convivendo com HIV/aids (GALVÃO, 2020).

No que se refere às vivências das mulheres brasileiras, se observa que as relações tradicionais de gênero acabam por expô-las ao risco da infecção, bem como pelas repercussões negativas do estigma relacionado ao HIV/aids para o manejo da soropositividade. Se faz necessário reconhecer a autonomia das mulheres na construção das suas trajetórias com a promoção da saúde sexual (VILLELA, BARBOSA, 2017).

O levantamento das cenas e cenários sexuais possibilita a inclusão de novos repertórios e novas experiências cotidianas que podem contribuir para a ampliação da conscientização para a ação e mobilização individual e social para a promoção da saúde e direitos sexuais (Paiva, 2018). A articulação entre ensino, pesquisa e extensão possibilita pensar a educação como caminho para a transformação social.

Referências
GALVÃO, J. COVID-19: Algumas reflexões, In: Associação Brasileira Interdisciplinar de AIDS (ABIA) (Org.). Dossiê ABIA. HIV/AIDS e COVID-19 no Brasil, 2020. disponível em: https://abiaids.org.br/, acessado em 27 de março de 2023.

GIAMI, A. COVID-19 et sexualités: l’émergence d’un nouveau paradigme des sexualités. Sexologies, v. 30, n. 1, p. 1-7, jan. 2021.

NASCIMENTO, V.L.V.; PEREIRA, C.C.Q.; VIDAL, D.D.R. COVID, estigma e Mídia: #eunaosouumvirus, In: SPINK, M. J. P.; CORDEIRO, M.P.; BRIGAGÃO, J. I. M.; MLINVERNI, C. (Org.). Covid-19: versões da pandemia nas mídias. São Paulo: Instituto de Psicologia da Universidade de São Paulo, 2021, pp.449- 534.

PAIVA, V. Escenas de la vida cotidiana: Metodología para comprender y disminuir la vulnerabilidad en la perspectiva de los derechos humanos. In: Paiva; Ayres; Carpriati; Amuchástegui & Pecheny. (Org.). 2018. Prevención, promoción y cuidado: enfoques de vulnerabilidad y derechos humanos. 1ed.Buenos Ayres: Teseo Press, v. 1, p. 141-201.

VILLELA, W. V.; BARBOSA, R. M.. Trajetórias de mulheres vivendo com HIV/aids no Brasil. Avanços e permanências da resposta à epidemia. Ciência & Saúde Coletiva, v. 22, n. Ciênc. saúde coletiva, 2017 22(1), p. 87–96, jan. 2017.

Sobre a autora
Daniela Barsotti Santos é professora do Programa de Pós-Graduação em Psicologia da Universidade Federal do Rio Grande (PPGPsi-FURG).


Imagem de destaque: Galeria de imagens

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *