Carta aberta aos adultos

Mariana Borchio
Coletivo Geral Infâncias

A violência faz parte do quotidiano dos humanos modernos. Ela começa com os discursos de ódio a determinados corpos que, de alguma forma, divergem da norma. Claro que a norma não é única e a infância é múltipla, assim como as violências vivenciadas e experimentadas por corpos infantis.

Conviver com crianças é presenciar a reprodução das mais diversas violências de gênero, de cor, de classe social, de heteronormatividade e de capacitismo. Além, claro, da privação do acesso à direitos como saúde, educação, alimentação, moradia…  Observar a destruição dos refúgios de vida naturais, inclusive humanos, numa sociedade em que a exclusão é mecanismo de manutenção de privilégios historicamente construídos, é angustiante.

Essas reproduções vão obviamente sendo construídas desde a primeira infância, na qual os padrões de gênero binário e de heteronormatividade são uma imposição naturalizada socialmente.

No fim da primeira infância, as crianças ficam atentas às reações do mundo, aos corpos ou aos comportamentos dissidentes. Ao mesmo tempo, alguns corpos são tratados com privilégio, e os privilegiados reagem com agressividade quando alguma justiça se instaura.

Além disso, crianças que vivenciam a passagem da infância para a pré adolescência são expostas a conteúdos inadequados, enquanto que aqueles extremamente necessários, como a educação sexual, o respeito ao corpo, à liberdade e à justiça social, são vistos como ameaças por algumas pessoas.

Se você anda desesperado com o que vê no mundo, imagine as crianças? Se você anda desesperado com as pancadas que leva do mundo, imagine as crianças?

Mas o pior mesmo é ver tudo isso sendo reproduzido entre as crianças. Participo de discussões em muitos circuitos de pessoas que estudam, militam, convivem com as infâncias. E o que sei, é que a violência reproduzida por uma criança, nos diz muito do que ela anda vendo ou vivendo.

Só posso, em nome dos adultos, pedir perdão às crianças.

 

Sobre a autora
Mariana Dias Duarte Borchio é mestranda PROMESTRA na FaE/UFMG (em curso), além de especialista em Educação pela PUCRS. Tem formação em Psicanálise pelo Instituto de Psicanálise e Saúde Mental, é graduada em Psicologia, Artes Plásticas e Pedagogia. Atua como Psicóloga Clínica, professora do Ensino Básico em BH e integrante do Coletivo Geral Infâncias.


Imagem de destaque: Compostagem dos saberes.  Artista: Mariana Borchio. Técnica mista. Desenhos feitos ao longo dos encontros do Ciclo Selvagem: Mulheres, Plantas e Curas de 2022.

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