Em Defesa da Escola Republicana: mais uma vez convocados(as)!

Por Luciano Mendes de Faria Filho

Constituição

Desde que se consolidou o movimento golpista pelo impedimento da Presidenta Dilma Rousseff e pelo desmonte do Estado e das políticas públicas voltadas para a maioria da população, um grupo de docentes da UFMG vem se reunindo e desenvolvendo ações em defesa da democracia. A proposta era que em cada uma das unidades da universidade houvesse um coletivo que organizasse o  movimento de resistência e de combate ao golpe.

Na Faculdade de Educação essa movimentação resultou em várias atividades coletivas, internas e externas à universidade, envolvendo os(as) alunos(as), os(as) Técnicos Administrativos(as) em Educação e os(as) professores(as). A última reunião, realizada em junho,  contou com a participação de vários sindicatos de profissionais da educação. Nela, fizemos uma pequena discussão sobre qual poderia ser uma proposta de um slogan ou de um projeto que reafirmasse nossa posição em defesa da escola pública e fosse, nesse sentido, um contraponto à ideia de uma escola sem partido.

Depois de várias manifestações, o nosso colega Paulo Nogueira, que trabalha na área de sociologia da educação, defendeu que a posição mais clássica  e o projeto mais contundente em direção a uma escola pública tal como vínhamos propondo são representados pela tradição da educação e da escola republicanas. E penso que ele tem toda razão!

Ao longo de nossa vida republicana, em vários momentos, a atualização e, por outro lado, o  tensionamento de nossas tradições autoritárias e produtoras das desigualdades sempre encontraram um terreno fértil no campo educacional. Lembremos que, logo após a proclamação, um dos focos de grande tensionamento do regime foi, justamente, o da educação, terreno em que os católicos, de forma especial, se mobilizaram contra a ideia da escola laica. Apesar de nossa escola republicana jamais ter deixado de ser, de fato, cristã e, notadamente, católica, aqueles foram tempos em que a igreja católica mobilizou os fiéis e reuniu forças para resistir ao regime sob o argumento que numa Nação católica o Estado não pode ser laico.

Tal tensionamento atravessou todas as primeiras décadas republicanas e, quando, em 1932, um grupo de professores e militantes da causa educacional e republicana, dando continuidade aos efervescentes anos de 1920,  resolveu publicar o  manifesto  A reconstrução educacional no Brasil – ao povo e ao governo,  em contraposição à investida católica sobre o Governo Provisório de Getúlio Vargas, eles não tiveram dúvida de, mais uma vez, explicitar que uma das faces importantes de republicanização da República era a defesa da uma escola pública, de sua  obrigatoriedade, sua gratuidade e sua laicidade,  e da coeducação.   A derrota dos movimentos sociais e a organização do Estado Novo, em 1937, mostrou o quanto os grupos reacionários e autoritários estavam dispostos para defender as suas causas. E não apenas no campo da educação, é preciso sempre lembrar!

O mesmo ocorreu nos anos de 1950, quando da tramitação no Congresso Nacional, do primeiro projeto de Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional. A história parecia se repetir, mas não apenas como farsa: novamente os movimentos religiosos e a hierarquia católica se aliavam aos grupos mais reacionários na defesa dos privilégios das escolas católicas e no combate às forças progressistas na luta pelos sentidos da escola pública. Não por acaso, em 1959, um grupo muito diverso de professores, intelectuais e ativistas, muitos dos quais haviam assinado o documento de 1932, publicou um manifesto, sintomaticamente denominado de Mais uma vez Convocados: Manifesto ao povo e ao governo, em que reafirmaram as diretrizes e bases de uma escola pública republicana: a universalidade, a gratuidade, a laicidade. De novo,  não apenas o teor privatista e antirrepublicano da LDB de 1961 mas, sobretudo, o golpe civil-militar de 1964 mostraram até onde os movimentos reacionários estavam dispostos a chegar para impedir o estabelecimento de uma escola pública mais inclusiva, mas aberta, mais democrática e de uma sociedade mais justa e menos desigual em nosso país.

Hoje, mais do que nunca, parece fazer sentido a reafirmação do ideário da educação e da escola republicanas entre nós. Sob a fumaça de escola sem partido, escondem-se, na verdade, as mesmas razões e as mesmas forças que outrora (sempre) combateram a escola republicana e dificultaram quaisquer avanços para tornar verdadeiramente republicana a nossa escola pública. Se, hoje, a  caracterização do que seja a escola republicana pode e deve ser muito mais refinada e alargada do que outrora, é sem dúvida a defesa desta que mobiliza e articula movimentos muitos diversos no espaço público.

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