Ameaça ao PNE e rumos da BNCC

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No último dia 05 de setembro, duas colegas da UFMG que participaram ativamente da elaboração da BNCC e que têm grande compromisso com a escola pública de qualidade, enviaram aos seus colegas da Faculdade de Educação uma nota de alerta sobre as ameaças ao PNE e sobre os novos rumos da BNCC. O Blog, com autorização das autoras, publica a mensagem.

Isabel Cristina Alves da Silva Frade

Maria Zélia Versiani Machado

Caros colegas da FAE,

Num momento de democracia em crise, gostaríamos  de divulgar   um fato bem grave que mostra esta crise na educação.  Com todas  as polêmicas que envolveram a concepção do que seria uma BNCC no campo educacional, a construção do  documento foi  conduzida segundo o que se defendia no Plano Nacional de Educação, mediante um processo que  envolveu várias instâncias e atores.   Seguindo o que estava proposto nas metas,  foi produzida  uma primeira versão   para a consulta  pública e  , depois , uma  segunda versão que  foi objeto de  discussão  em fóruns estaduais durante o mês de julho e agosto deste ano. O  resultado dessas consultas  e debates geraria uma terceira versão, a ser  enviada ao CNE .

No mês de maio de 2016,  enquanto este processo estava em andamento e  no momento em que era apresentada  a segunda versão do documento, foi realizado um seminário sobre a  BNCC  na câmara e, depois, entrou na pauta  o  projeto  Escola sem partido. Em função deste contexto,  a equipe que participou da elaboração da BNCC  divulgou imediatamente  uma nota,  denominada  NOTA DE ESCLARECIMENTO E MANIFESTAÇÃO DE POCIONAMENTO DO COMITÊ ASSESSOR E EQUIPE DE ESPECIALISTAS QUE ATUARAM NA ELABORAÇÃO DA BASE NACIONAL COMUM CURRICULAR”, alertando  sobre os riscos de perdermos o caráter democrático de consulta  e produção que tínhamos conseguido instituir até o momento em que foi divulgada a segunda versão.

Em fevereiro de 2016  também foi apresentado à Câmara dos deputados o Projeto de Lei  Nº 4.486, DE 2016  que “Altera a Lei nº 13.005, de 25 de junho de 2014, Plano Nacional de Educação – PNE, visando que a Base Nacional Comum Curricular – BNCC, mediante proposta do Poder Executivo, seja aprovada pelo Congresso Nacional.”, de autoria do  deputado ROGÉRIO MARINHO.

Este projeto, assim como o da Escola sem Partido, já  revelava as forças conservadoras que estavam espreitando o país , às vésperas do processo de impeachment. Nos últimos dias de agosto,   o processo de tramitação avançou e foi divulgado o parecer do deputado  Átila Lira sobre a PL de Rogério Marinho.  Invocando questões de ilegalidade, resultados do PISA e  interpretando a atual versão como  doutrinária e sem base científica e pedagógica,  o  relator tenta retomar discursos de João Batista de Oliveira e  Ilona Becskeházy  que prescrevem o que deveria ser uma BNCC, mostrando o tipo de argumentação que esta por vir e  a mudança de concepção sobre o que seria a BNCC pois há, no parecer, uma ideia de conteúdos mínimos e  programas fechados. Para o relator, se a BNCC envolve  direitos, o tema seria deliberado na câmara e não com a sociedade.

Vejam trecho final do parecer:

“Após todas as considerações e análises que apresentamos, é possível concluir que o processo adotado até o momento para a construção da BNCC não é adequado e está muito distante das melhores práticas científicas e pedagógicas, além de possuir indícios de ilegalidade. Os documentos apresentados invadem, em muitos momentos, a esfera de competência do Poder Legislativo ao determinar direitos. O documento possui um claro viés doutrinário, falhando em ofertar a pluralidade do pensamento e das teses científicas. Isso se explica pela ausência de pluralidade entre aqueles que escreveram o documento. A pluralidade necessária não se encontra no grande número de pessoas que trabalharam direta ou indiretamente na elaboração do resultado final, mas na participação de diferentes correntes do pensamento científico.   O currículo comum que se almeja implementar no Brasil deve ser construído em conjunto com Estados, Municípios e o Distrito Federal, sob a pena de se desrespeitar a autonomia dos entes federados. Portanto, imprescindível que os representantes desses entes participem ativamente dessa construção. É necessário levar esses debates ao espaço democrático apropriado para a sua discussão: o Congresso Nacional. Se o MEC pretende criar direitos com a BNCC, mais um argumento favorável para que o documento seja apreciado e chancelado pelo Congresso Nacional.  Dessa maneira, e diante de todo o exposto, voto pela APROVAÇÃO do Projeto de Lei nº 4.486, de 2016.

Relator: Deputado ÁTILA LIRA “

Se este Projeto de Lei  for aprovado na Câmara,  temos sérias ameaças  ao processo    que envolveu a  participação  de várias instituições científicas, universidades, professores da escola básica,     pacto interfederativo  com UNDIME e CONSED e  as ações do CNE.  Em última instância, o precedente abriria espaço para desmontar  o próprio PNE .

Em função desta ameaça e de nos resguardarmos de efeitos de suas consequências para a democracia e em nome de assessores que participaram do processo, solicitamos a avaliação e apoio de vocês  para  divulgar o que está ocorrendo. O momento é grave e exige de nós tomadas de posição que mostrem nossa resistência.

Um abraço!

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