A educação em tempos sombrios: perspectivas para a educação no governo Provisório de Temer

Por Luciano Mendes de Faria Filho

Como tem sido amplamente noticiado, parte significativa dos ministros escolhidos por Temer para compor seu governo provisório não tem afinidade nenhuma com a pasta que vai dirigir. No caso da Educação, não bastasse essa assertiva ser mais verdadeira do que nunca, há, ainda, a (com)fusão do MEC com o Ministério da Cultura.  Mas cumpre notar que, para a Secretaria Executiva do Ministério, foi chamada a Profª. Maria Helena de Castro Guimarães. Ela, diferentemente do Ministro, é estudiosa e conhecedora da educação brasileira e teve papel destacado na gestão da educação nos governos FHC, junto com Paulo Renato, e nos governos do PSDB em São Paulo. Certamente, no campo específico das políticas educacionais em que conhecimentos técnicos forem necessários, é ela e sua equipe que darão as cartas, ou pelo menos tentarão.

Sabe-se também que o governo provisório do Temer tem pressa, muita pressa, em desmantelar as políticas de Estado garantidoras de direitos, quando não o próprio Estado, seja porque os que deram sustentação financeira, midiática e política ao processo que culminou no golpe do afastamento provisório da Presidente Dilma já estão cobrando a fatura, seja porque a equipe golpista sabe que a passagem por lá pode ser mais curta do que o imaginado.

Diante disso, a expectativa que se tem, nos meios acadêmicos e entre os movimentos sociais, aí incluindo os de professores, é a de que haverá, num espaço de tempo muito curto, um ataque frontal às políticas educacionais postas em ação nos últimos 13 anos  O que se observa nos últimos dias, aliás, é que o ataque já começou.  A demissão ilegal do Diretor-Presidente da EBC é um anúncio de que, assim como no processo de impedimento da Presidente, o Estado de Direito foi subjugado, a Constituição rasgada. Aos amigos tudo; aos inimigos a lei!!

Uma das ações já anunciadas será a busca de reforma da Constituição, conforme o projeto de “Ponte para o Futuro”, para a desvinculação constitucional de recursos para a educação e a saúde. Se a situação, sobretudo nos estados e municípios já é crítica hoje, imaginem com a desvinculação!

Em segundo lugar, em sintonia com o fechamento do Ministério das Mulheres, da Igualdade Racial, dos Direitos Humanos e da Juventude, tenderá a haver uma paralisação das ações que esse Ministério desenvolvia em conjunto com o MEC. Aí, pelo que anunciam todos os dias os grupos conservadores e religiosos os mais diversos, não ficará pedra sobre pedra. A expectativa é que sejam interrompidas, sobretudo mas não apenas, todas as políticas e ações referentes ao reconhecimento e à promoção dos direitos dos grupos LGBTs do país.

No campo da Educação Básica, a considerar os posicionamentos anteriores do grupo que ascende ao poder, ainda que provisoriamente, haverá uma maior vinculação da educação infantil à escola fundamental, enviando para o espaço boa parte daquilo que os especialistas defendem como sendo a especificidade da educação para as crianças pequenas. Nesse terreno, corre-se o risco de que as brincadeiras das crianças, na escola,  se transformem, de uma vez por todas, em coisa do passado.

No caso do Ensino Fundamental e do Ensino Médio, o que se espera é um recrudescimento da vontade de impor as Bases Nacionais Curriculares como uma das principais políticas de Estado. Do mesmo modo, as diretrizes traçadas anteriormente por esse grupo consideram fundamental uma maior vinculação do Ensino Médio ao mercado de trabalho, desmantelando o que consideram um excessivo viés acadêmico desse nível de ensino. Certamente a formação para o trabalho, entendida num sentido muito pragmático, assim como as avaliações sistêmicas se imporão como nunca como critérios para aferição da qualidade da educação.

Política particular será desenvolvida para os professores da escola básica. No campo da formação, não podemos esquecer a enfática defesa da própria Maria Helena de que as Faculdades de Educação, com seus cursos de Pedagogia e demais Licenciaturas, deveriam ser fechadas, pois prestam um desserviço à educação brasileira. Ou seja, substituir a formação excessivamente teórica e política das Faculdades de Educação por uma educação mais técnica,  menos política e mais pragmática, em consonância com o que já defendia a Profª. Guiomar Nambo de Mello, muito próxima da Secretária Executiva do MEC,  já nos anos de 1980.

Por fim, certamente haverá uma mudança dos parceiros do MEC na operacionalização das políticas e ações propostas pelo Ministério para a Educação Básica. Como se sabe, na ausência de uma burocracia especializada e de carreira no MEC, ele depende fortemente do concurso de outras agências para fazer com suas propostas saiam do papel. Nos últimos anos, esses parceiros foram as universidades públicas, mais especificamente seus professores e alunos de pós-graduação. No entanto, é pouco provável que essa parceria continue, seja porque ela não serve aos novos propósitos do Ministério, seja porque é bem provável que não haja engajamento dessa mão de obra altamente especializada e, é bom que se diga, relativamente barata, nas políticas e ações a serem desenvolvidas nesse futuro próximo.

Ainda no que se refere aos professores, atenção especial deverá ser dada à questão salarial. A opção, já anunciada, pelo bônus de produtividade ao professor é continuidade das políticas de vários governos estaduais e municipais alinhados com o grupo que está no MEC. Do mesmo modo, haverá um recrudescimento do ataque ao piso nacional como política obrigatória em todo o território nacional e, sobretudo, uma mudança em sua forma de correção.

No ensino superior,  par da política de fortalecimento da iniciativa privada, iniciada no governo FHC e continuada nos governos de Lula e de Dilma, a tendência é que haja um foco nas universidades públicas. Aqui, as reformas tenderão a diversificar o modelo da oferta público no ensino superior, colocando em cheque a universidade e os institutos como modelos únicos, bem como a diversificação da oferta de cursos, sobrevalorizando aqueles vinculados diretamente às “necessidades” do mercado de trabalho.

Na pesquisa e na pós-graduação a perspectiva é que as mudanças mais imediatas sejam nas modalidades de financiamento. A equipe que vem sendo montada no MEC certamente sabe que as universidades como um todo, mas especialmente a pós-graduação, onde se realiza quase a totalidade da pesquisa no país, apresenta uma inércia própria e de difícil mudança a curto prazo. Nesse sentido, a mudança  imediatamente possível passa pela alteração das formas de financiamento, com uma previsível diminuição do financiamento das área de humanas e sociais e um aumento do financiamento dos cursos mais próximos das “necessidades” do mercado, notadamente os mestrados profissionais.

Ainda no campo da pesquisa, aliado à reestruturação do ensino superior público, não será nenhuma surpresa se for resgatada aquela ideia, elaborada lá no governo FHC, de uma concentração, maior ainda do que já existe, em alguns “centros de excelência”, particularmente nas universidades estaduais paulistas e nas grandes universidades federais. Nas demais, alguns poucos grupos ou departamentos de excelência e, no mais dos casos, uma transformação paulatina em instituições de ensino e extensão de melhor qualidade.

 

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