Entrevista de Jean Wyllys à EBC e o lugar da comunicação pública nas democracias

Por Luciano Mendes de Faria Filho

Assisti, ontem à noite (17/05), a uma entrevista ao vivo do Deputado Federal pelo PSOL(RJ) Jean Wyllys ao Programa Espaço Público da EBC. Foi, para mim, uma entrevista esclarecedora por vários motivos: primeiro, pela inteligência, clareza e segurança das reflexões do Deputado acerca de vários aspectos da vida nacional; segundo, pelas análises específicas sobre o processo que resultou no golpe que afastou a Presidenta da República do cargo e permitiu a instalação do governo provisório do Temer e sua turma; e, terceiro, pela fato de ser numa emissora pública.
Aliás, a análise da demissão ilegal do Diretor-Presidente da EBC, Ricardo Melo, foi um dos aspectos mais interessantes da entrevista. Como se sabe, o Presidente Provisório demitiu o Diretor da EBC de forma ilegal, já que este estava em cumprimento, segundo a lei que regula a organização da EBC e a escolha de seu Diretor, de um mandato de 4 anos e não poderia ser demitido. A lei estabelece que o mandato não coincida com o do Presidente da República justamente para evitar a transformação da rede pública numa rede oficial do governo.
Pois bem, diante da indagação sobre o assunto, Jean Wyllys foi muito claro: está em curso, aí, mais um golpe contra a democracia. Não apenas pela ilegalidade do ato, disse ele, mas também porque o governo provisório quer colocar na direção da EBC os mesmos sujeitos que, na Câmara, fizeram da TV, da Rádio e do Jornal do parlamento, porta-vozes do Eduardo Cunha e de seus comparsas. Ainda a esse respeito, o Deputado informou que, durante a gestão desse grupo na comunicação da Câmara dos Deputados, ele e outros(as) parlamentares que defendiam posições contrárias às de Cunha foram banidos da programação, num claro ato de censura.
A respeito do Governo Provisório e de seus primeiros atos, também o Deputado lembrou: eles têm pressa, não apenas porque quem financiou o processo de impedimento está cobrando a fatura, mas também, e talvez sobretudo, porque sabem que esse governo pode ser nada mais do que um Governo Provisório.
Dentre os muitos outros aspectos focalizados na entrevista, Jean Wyllys falou também sobre suas parcerias com a Senadora Marta Suplicy (PMDB-SP) e sobre as possíveis razões de seu voto a favor do impedimento da Presidente. Ele reconheceu a importância da ação da Senadora e das parcerias com ela para o avanço da pauta das mulheres e LGBT no parlamento, mas disse não concordar, em absoluto, com a justificativa da Senadora de que estava votando, no caso do impedimento, a favor das mulheres e dos homossexuais. Segundo o Deputado, na hora de votar, parece que a identificação de classe da Marta Suplicy falou mais alto do que a identificação com sua própria história pública.
A respeito de uma possível derrota da turma do Terer e do Eduardo Cunha no Senado, Jean Wyllys acha que isso é possível e dependerá, fundamentalmente, das manifestações, as mais variadas, da população, especialmente dos movimentos organizados. Mas também adiantou que será preciso que as esquerdas tenham uma pauta mais abrangente do que aquela normalmente estabelecida. Chamou a atenção, por exemplo, para as novas demandas, que ultrapassam aquelas classistas normalmente abraçadas pelas esquerdas, ao indicar para os conflitos de gênero e religiosos, por exemplo, que exigem novas reflexões e respostas.
Perguntado também sobre sua avaliação sobre o Ministério do Governo Provisório de Temer, Jean Wyllys brincou “que sobra testosterona e falta melanina”! Disse que não era surpresa nenhuma, pois não cabe na mente daqueles senhores brancos que haja mulheres ou negros competentes o suficiente para dividir, com eles, o exercício do poder no espaço público. Ele lembrou, inclusive, que a Presidenta Dilma, em seu segundo mandato, foi impedida de governar desde o primeiro dia e que boa parte do investimento contra ela tem a ver com o fato de ser uma mulher que ousou ocupar o lugar consagrado aos homens.
Ao longo da entrevista, por diversas vezes, veio à tona a falta de fundamentação jurídica para o processo de impedimento da Presidenta. Foi lembrada, inclusive, a fala de Dilma Rousseff de que poderia ter cometido erros, mas não crime. No final da entrevista, alguém perguntou a Jean Wyllys quais erros da Presidenta poderiam ter favorecido a articulação que levou ao golpe. O Deputado foi claro e taxativo: o principal erro do governo foi ter adotado, depois de eleito, o plano de governo do candidato derrotado. Em nome da governabilidade, Dilma Rousseff teria, a cada dia, perdido mais e mais o poder de governar. O resultado é este que estamos vendo.
Esse pequeno relato é para dizer o quanto gostei da entrevista. Mas é também para lembrar e reafirmar a importância da comunicação pública para a vida democrática. Ali, naquele espaço, como em nenhum outro, pode-se ouvir um Deputado assumidamente homossexual defender abertamente a pauta LGBT, a descriminalização do aborto, a minorias e, de forma escancarada, fazer uma crítica contundente aos poderes da República. Perder isso, perder a EBC e transformar a comunicação pública numa comunicação de governo será mais um desserviço que temos a temer deste Governo Provisório.

Veja o vídeo abaixo.

 

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