Dá para pagar a universidade publica?

Instituições e entidades científicas reagem ao documento “Um ajuste justo – propostas para aumentar eficiência e equidade do gasto público no Brasil” do Banco Mundial.

Na última terça-feira, dia 21, O Banco Mundial publicou um estudo intitulado “Um ajuste justo – propostas para aumentar eficiência e equidade do gasto público no Brasil”. O documento foi encomendado em 2015, pelo então ministro da Fazenda, Joaquim Levy, ainda no governo Dilma, e o resultado foi apresentado na última semana.

Segundo a instituição, o relatório realiza uma análise aprofundada dos gastos do governo, identificando alternativas para reduzir o déficit fiscal a um nível sustentável e, ao mesmo tempo, consolidar os ganhos sociais alcançados nas décadas anteriores. O diretor do Banco Mundial para o Brasil, Martin Raiser, afirma que o “trabalho tem por objetivo mostrar que é possível realizar o ajuste fiscal que o País busca e ainda promover maior igualdade social, preservando os mais desfavorecidos”.

Dentre as sugestões apresentadas no documento para aumentar a eficiência e a equidade dos gastos públicos do país, o Banco Mundial propõe a cobrança de mensalidade para alunos de alta renda em universidades públicas brasileiras. Isso porque, segundo o relatório, o Estado brasileiro gasta muito no ensino superior público, principalmente quando se compara com o gasto anual por aluno nas instituições privadas.

“Limitar os gastos por aluno aos níveis das universidades mais eficientes geraria uma economia imediata de 0,26% do PIB. As universidades que receberem menos recursos como resultado desta medida teriam de reconsiderar sua estrutura de custos e/ou buscar recursos em outras fontes, como já é a norma nos sistemas acadêmicos com os melhores níveis de desempenho. Uma opção para aumentar os recursos das universidades federais sem sobrecarregar o orçamento seria a introdução de tarifas escolares. Isso é justificável, pois o ensino superior oferece altos retornos individuais aos estudantes e, com base em dados atuais, o acesso privilegia fortemente estudantes de famílias mais ricas. Paralelamente, é necessário facilitar o acesso a mecanismos de financiamento para estudantes que não possam pagar as mensalidades. Felizmente, o Brasil já possui o programa FIES, que oferece empréstimos estudantis para viabilizar o acesso a universidades privadas. O mesmo sistema deveria ser expandido para financiar o acesso a universidades federais. A ampliação do FIES para incluir universidades federais poderia ser combinada ao fornecimento de bolsas de estudos gratuitas para os estudantes dos 40% mais pobres da população, por meio do programa PROUNI. Juntas, essas medidas melhorariam a equidade do sistema e gerariam uma economia para o orçamento federal de aproximadamente 0,5% do PIB.” (Relatório Um ajuste justo – propostas para aumentar eficiência e equidade do gasto público no Brasil, pgs 139 e 138)

Diante deste quadro, especialistas e diversas instituições científicas relatam o prejuízo que tal iniciativa causaria na Ciência e Tecnologia, além de denunciar as incoerências do texto. Em reportagem do Jornal do Brasilpublicada no ultimo dia 26, o professor de Políticas Públicas da Universidade Federal do ABC (UFABC), Wilson Mesquita de Almeida, lembra que “As [universidades] privadas no Brasil, predominantemente voltadas para o lucro, não fazem pesquisa, ou seja, produção de conhecimento novo. Inovações, vacinas, dentre outras descobertas que auxiliarão a sociedade, são desenvolvidas, sobretudo, nas universidades públicas, que o Banco Mundial quer desfigurar”.

Representantes de universidades também se manifestaram, como é o caso da Universidade Federal do Rio de Janeiro e da Universidade Federal Fluminense. Para o Vice-reitor da UFF, professor Antonio Claudio da Nóbrega, “é nas universidades públicas onde se desenvolvem pesquisas científicas, são gerados o conhecimento do país e as inovações para a sociedade. Para isso, são necessários laboratórios e equipamentos, muitos deles sofisticados, com alto custo de aquisição e manutenção. É assim em todo o mundo. Desse modo, ignorar a produção de conhecimento numa sociedade de conhecimento é no mínimo desconhecer o papel da universidade pública para o desenvolvimento do país de forma autônoma e soberana”.

Entidades científicas também se manifestaram, é o caso da Andifes, SBCat, ANPEPP, SBMO, SBFV, SBMAG, Abralin, SBQ, Anped, SBP, ABCF, Socicom, Ampur, AMPEPP, SBG, SBP, SBFgnosia, SBM, ABCr, SBPMat, ULEPICC-Brasil, ABFM e SBCS.

 

Confira mais artigos sobre a proposta do Banco Mundial:

O Banco Mundial contra-ataca – Jornal da UNICAMP

Uma análise do documento “Um Ajuste Justo: análise da eficiência e equidade do gasto público no Brasil” – Avaliação Educacional

Relatório do Banco Mundial compara alhos com bugalhos no ensino superior – Direto da Ciência

Universidade pública ainda é injusta, mas cobrar mensalidade não é a saída – Folha de São Paulo

Banco Mundial não propôs ajuste justo – Folha de São Paulo

Banco Mundial: ajuste regressivo e antidemocrático – Roberto Leher para o Jornal da Ciência

 

Yolanda Assunção

 

Imagem de destaque: Diogo Nascimento

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