COOPERAÇÃO INTERNACIONAL SUL-SUL: a experiência do PPGE-UFMG  com a Universidade 11 de Novembro (Cabinda/Angola)

uon

Por Maria de Fátima Cardoso Gomes*

Esse texto trata do Programa de Pró-Mobilidade Internacional de docentes e discentes CAPES/AULP iniciou-se em 2013, concebido pelos professores da Faculdade de Educação da Universidade Federal de Minas Gerais, Maria de Fátima Cardoso Gomes, Marcelo Ricardo Pereira e Maria Inês Mafra Goulart. O projeto tem como objetivo a formação por meio de mobilização de docentes e discentes brasileiros e africanos. Nossa parceria de trabalho fez-se com a Universidade 11 de Novembro (UON), de Cabinda, Angola porque já havíamos iniciado processo de formação de mestres e doutores, em 2012, sob a guarda de convênio marco, assinado pelos reitores de ambas as universidades. Especificamente, protagonizamos a formação de professores do Instituto Superior de Ciências da Educação (ISCED) da UON. O projeto conta com coordenações angolana ( Nlandu Balenda) e brasileira (Maria de Fátima Cardoso Gomes). Nosso projeto visou à criação e implantação do Laboratório de Ensino e Pesquisa de Psicologia, Psicanálise e Educação (LPPE)  no ISCED/UON que foi inaugurado em maio de 2015 e está sob a direção do Dr. Nlandu Balenda e Dr. Francisco António Macongo Chocolate, este último é também Pró-reitor de Extensão e Comunicação da UON.

O LPPE foi estruturado em quatro Grupos Operativos: Ensino, Pesquisa, Extensão e Publicação, que contam com a participação de 40 professores, mais ou menos 10 em cada um. A criação desses quatro grupos representa um grande avanço na concepção e papel da universidade em Cabinda (Angola) que até então tem suas ações voltadas principalmente para o ensino. Introduzir as discussões e práticas de extensão e pesquisa com consequentes publicações na UON significou muitas horas de encontros e debates entre brasileiros e angolanos. E, até o momento ainda constitui grande desafio para se colocar em prática essas dimensões de trabalho na universidade para nossos parceiros.

O grupo de ensino visa essencialmente repensar a formação de psicólogos no ISCED, que tem por missão ainda a formação de Licenciado em Psicologia. Isto vem trazendo à tona discussões em torno das seguintes perguntas:

  • Qual profissional de psicologia se que formar no ISCED?
  • Psicólogo Escolar e não Licenciado em Psicologia?
  • Quem é o profissional Psicólogo Escolar que a realidade de Angola exige hoje?
  • Quais problemas esses profissionais terão de enfrentar em sua prática?

O grupo de pesquisa tem por tarefa organizar as pesquisas que já são realizadas no ISSCED, em nível de graduação, os TCCs monográficos e deles retirar projetos coletivos ou individuais de pesquisa para aprofundamento dos problemas que vivenciam no dia a dia das escolas básicas, essencialmente.

O grupo de extensão tem por objetivo realizar projetos que atendam à formação de professores da Educação Básica no que tange aos problemas escolares relativosao fracasso escolar, problemas com alcoolismo, etc.

O grupo de publicações tem por objetivo socializar as produções dos três grupos mencionados anteriormente.

Paralelamente a este trabalho realizamos diagnóstico da situação das salas de leitura do ISCED e UON e constatamos a precariedade do acervo e organização das mesmas. Essa ação levou a UON e o ISCED a reduzir um pouco dessa precariedade na compra de livros, catalogação dos mesmos e organização de espaços de estudo para os estudantes. Hoje, se pensa em torno de organização de bibliotecas e não apenas de salas de leitura na universidade como um todo. Além disso, está em regime de aprovação pelo Ministério de Ensino Superior, um Curso de Mestrado com três linhas de pesquisa: Psicologia Escolar, Educação Matemática e Didática do Ensino Superior.

Enfim, tudo isto foi possível por construirmos parcerias entre professores (49) e estudantes brasileiros e angolanos de graduação (seis) e pós-graduação (quatro).

O que orientou nossa parceria? O que entendemos por laboratório? Diferentemente da concepção tradicional de laboratório que se desenvolveu na psicologia, como um lugar de se testar pessoas e animais, de se fazer experiências para se testar hipóteses, nossa concepção de laboratório pressupõe que ele seja:

um lócus orgânico de todas as ações e iniciativas acadêmicas de psicologia, psicanálise e educação endereçadas e inscritas no LPPE-ISCED-UON. Mais do que um mero espaço físico, o LPPE fundamenta a Linha de Pesquisa, reúne toda a produção na área e cria um sítio para onde se convergem o ensino, a pesquisa e a extensão – os três pilares fundamentais que sustentam as atividades de uma universidade contemporânea. (LPPE, 02/04/15)

O laboratório traz a preocupação de dialogar com as realidades educacionais Cabindenses, com as necessidades da sociedade Cabindense. Não desejamos fazer desse laboratório um lugar asséptico, pelo contrário, queremos contaminá-lo com as questões e problemas que afligem aos educadores Angolanos e procurar soluções coletivas para as questões e problemas encontrados. Soluções que exigem pesquisas in loco, ou seja, nas escolas, nas salas de aulas e não testes fora dos locais onde os problemas aparecem. É necessário compreender, então, os fenômenos educativos, seus problemas, para, então se fazer uso ou não de conhecimentos da psicologia, da psicanálise e da educação.

Bem, partimos do pressuposto de que é no contexto da interlocução, vista como o processo de construção de significação (PINO, 2000) que as pessoas e suas práticas culturais são construídas. Segundo Gomes, Neves & Dominici (2015) o sujeito ao apropriar-se do mundo que o cerca atribui sentido às suas práticas culturais e dependendo da cultura em que vive esses sentidos vão variar muito. Essa variação de sentidos das práticas culturais das duas universidades construídas pelas pessoas que delas participam é que nos interessou compreender de modo contrastivo, pois pelo contraste podemos evidenciar as diferenças e semelhanças entre as práticas de ensino, pesquisa e extensão da FAE/UFMG e as práticas de ensino, pesquisa e extensão do ISCED/UON. Desse modo, as práticas culturais escolares e educacionais e suas significações também sofrem mudanças ao longo dos tempos que devem ser compreendidas pelos educadores. Isto porque estamos tratando aqui de culturas, no plural, que não se perpetuam, mas que se modificam o tempo todo nas diferentes sociedades. O que dissemos e fizemos, até aqui, orientam o futuro de nossa parceria: o que se produziu de significação para as práticas de ensino, pesquisa e extensão na FAE/UFMG e no ISCED/UON? Como analisar essas práticas culturais como atividades humanas e não apenas como atitudes individuais de seus participantes? Reconhecemos que as atividades humanas são históricas, coletivas e dialéticas, mudam o tempo todo por meio do discurso e das práticas culturais. Quais mudanças ainda poderão acontecer nas práticas de ensino, pesquisa e extensão em ambas as universidades?

Referências

LPPE – Laboratório de Ensino e Pesquisa de Psicologia, Psicanálise e Educação, Cabinda: 02 de abril de 2015 [conferência]

GOMES, Maria de Fátima C.; NEVES, Vanessa F. A. & DOMINICI, Isabela C. Fractal: Revista de Psicologia, v. 27, n. 1, p. 44-49, jan.-abr. 2015.

PINO, Angel S. O social e o cultural na obra de Vigotski. Educação & Sociedade, Campinas, v. 21, n. 71, p. 45-78, jul., 2000.

* Coordenadora do PPGE-FaE/UFMG e do  Programa de Pró-Mobilidade Internacional de Docentes e Discentes CAPES/AULP – Implantação do Laboratório de Ensino e Pesquisa de Psicologia, Psicanálise e Educação no ISCED/UON em parceria com a FAE/UFMG

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