Bienal Mineira de Livros: inclusão e exclusão

Iriam Starling

Depois de 4 anos, a Bienal Mineira do Livro ressurge, para felicidade dos amantes do livro e da educação. A última edição tinha sido em 2018. Vou limitar este texto à minha experiência, visto que os dados numéricos dos vales-livros e de público estão bem evidenciados nos artigos dos diversos jornais e blogs.

Ver acontecer a Bienal foi uma alegria ímpar, apesar dos problemas que nós, pequenos editores, enfrentamos. Belo Horizonte precisa ter mais eventos literários. Pequenos, médios ou grandes, não importa. Importa colocar o livro e a cultura em evidência.

Vi uma multidão de jovens e crianças saindo com sacolas de livros nas mãos. Isso não tem preço. O melhor de tudo é que elas puderam escolher os livros. Mesmo os pequenos. Ponto para o Grupo Asas, organizadora do evento. Para a maioria dos alunos, era a primeira vez que puderam fazer isso. Estavam extasiados diante da imensidão de livros. Como escolher?

Outro ponto positivo foi a colocação dos autores das diversas editoras na programação oficial. A equipe de suporte falhou em alguns aspectos, mas brilhou em outros. Tivemos apoio de infraestrutura e acolhimento de nossos autores. Mas pecaram na divulgação. Os vídeos que nos pediram para fazer as chamadas não foram editados e nem publicados. Consegui espaço para seis de nossos autores na programação, mas tive que produzir a maioria dos posts. Apenas alguns de nossos autores foram divulgados no Instagram do evento. Apesar disso, a Bienal teve uma boa divulgação na mídia, em geral.

Outro ponto que eu considerei positivo foi a escolha dos artistas para os shows. Privilegiaram os artistas regionais e a nossa cultura. Há quem reclamou da falta de grandes estrelas no evento. Possivelmente isso ocorreu por falta de patrocínio, mas, no meu modo de ver, só valorizou o livro e a cultura mineira. Quem foi ao evento, foi por causa dos livros e da nossa cultura. Outro ponto para o Grupo Asas.

A estação de leitura inclusiva também foi muito boa. Precisamos dar visibilidade à leitura inclusiva. Produzir livros em libras, braile e audiolivro é muito caro e livro tátil mais ainda. É preciso subsídios públicos e/ou privados e políticas públicas para que tenhamos mais títulos traduzidos para essas linguagens.

Agora vamos aos problemas, que não foram poucos. A começar pelo preço, que inviabilizou a participação de muitas editoras, especialmente as pequenas. Eu já tinha quitado meu estande em 2019, que dividi com a editora Rolimã, depois de chorar muito. A inclusão do espaço para autores independentes também foi uma luta, mas também ficou muito caro.

Equidade é algo que passou longe da organização da Bienal. Os grandes eventos, em geral, não permitem que as editoras dividam os estandes. Para mim, isso só visa o lucro, uma vez que beneficia apenas as grandes empresas e prejudica a bibliodiversidade. Sendo um evento promovido pela Câmara Mineira do Livro (CML), isso me soa pior ainda. Para complicar, os estandes pequenos foram colocados no fim da feira. Ou seja, vendas zero. As pessoas que chegavam lá, já tinham gastado os vales ou o dinheiro para as compras. Isso foi tão sério, que tiveram que remover os últimos estandes, no segundo e terceiro dia, para uma posição um pouco mais próxima da entrada. Meu estande era o último e continuou sendo o último. Não vendemos quase nada nos 3 primeiros dias. A partir do quarto dia tivemos que ir para a entrada para buscar algumas turmas de escolas para nosso estande. E houve empresa reclamando disso.

Outro grave problema foram as regras impostas pela CML, que, no final, foram letras mortas. O regulamento que nos foi colocado exigia um preço mínimo dos livros de R$20,00, proibia a venda de brinquedos, livros usados, entre outros. Pediram uma tabela de títulos para com vendas individual e outra com vendas de kits de dois títulos por R$30,00. Nós, inocentemente, corremos para mandar nossas tabelas, que tinha prazo para entrega. As grandes empresas (livrarias, distribuidoras e vendedores de saldão) nem se preocuparam com as regras e sequer mandaram suas tabelas. Venderam brinquedos, adesivos, quebra-cabeças, revistinhas usadas com preços de 2 a 5 reais e muito mais. De nada adiantou nossa reclamação, logo no primeiro dia. Ao invés de cobrar o cumprimento das regras, permitiram a venda de livros a 10 reais com os vales e abriram mão das tabelas. Na prática, foi vendido de tudo com os vales-livros. O sistema de vales que colocaram não permite que saibam o que, de fato, foi vendido. A fiscalização também foi nota zero, pois isso aconteceu durante todo o evento.

Vários adolescentes “venderam” seus vales para comprar sanduíches e sorvetes. Não foram poucos os que ofereceram venda de vales em nosso estande. Mas se venderam, é porque algumas empresas compraram. Muito triste isso. Que tipo de cidadão estamos formando se empresas que trabalham com livros fazem esse tipo de negociata?

Precisamos lutar contra esse capitalismo selvagem. Essas empresas não precisam disso para sobreviver, mas não se importam com as consequências de seus atos. Havia clientes suficientes para todos venderem bem e lucrar, mas os pequenos foram prejudicados em favor das empresas que investiram um grande capital. E são sempre as mesmas. Não basta ter lucro, tem que destruir os “concorrentes”, pois é mais fácil que lutar para melhorar o mercado do livro no Brasil.

Este relato é apenas uma pincelada do que presenciei na Bienal, mas ver os olhos das crianças brilhando, ávidas pelos livros, foi tão gratificante que nem estou me descabelando com as dívidas que fiz para participar da Bienal Mineira do Livro. Vou deixar para meus credores se preocuparem.


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1 comentário em “Bienal Mineira de Livros: inclusão e exclusão”

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